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A UMA FORMIGA APOSENTADA

- Absurdo - diz-me a crítica
nauseante de recheios sãos, em uníssono.
Eu falo:
- A técnica é necessária, sim. Sim mas Não.
Sou um eco, carburando dores.
Sou insano, como o estômago do lixão.
Minhas flatulências ontológicas e homéricas destronam reis lears
e assumem o reinado do mau gosto.
Ela veio até mim querendo que eu ensinasse
o segredo do brilho em meus olhos.
Ela veio até mim com o útero como lança.
Eu fui até ela carregado de antigas presas mastodônticas,
havia dentes e retalhos de pele em minhas unhas.
Já havia retalhado a carne nos rochedos,
até atingir o fígado de Prometeu.
Ela veio até mim, inocente do ser primitivo
e dos deuses que eu havia devorado.
Ela desconhecia meu poder antropofágico,
as virtudes menores que os defeitos que arrebatei.
Um certo orgulho no calombo das costas,
uma vaidade descomunal nas costelas,
meu andar torto de ator de mambembe.
Ela não notou minha sede, minha fome.
Apenas queria o fogo de Prometeu.
Por quê quando eu subi as escadas e bati à janela,
ela não abriu simplesmente e em abrindo me diria
- boa noite, pode entrar 

e usar meu corpo 
e ser da melhor maneira? 
Mas não.
Melhor era me deixar na chuva, 

com relâmpago e trovões.
Sem o querer, descobri ali 

que o teatro em mim
era um corte antecipado 

pelo bêbado lúcido Dionisio
que me esperava para mais antropofagia.

Subi o telhado da crítica, 
escorreguei no musgo da minha tia,
e, pendurado no beiral, 
pude libertar a patinha
de uma formiga aposentada 
dos doces da velhinha surda.

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