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Mostrando postagens de janeiro, 2014

NA LUZ DE ALGO

Obrar na luz trespassar o mito aí representar Hércules ou Hiroito assim jogar o rito  no punhal da história o corpo nosso sangrando o dito nisso que chamam platéia e colher os aplausos

SALVO POR DENTRO

Um estilo,  estúpido modo de me demarcar. Tudo é tão rápido  e muda sem esperar. O que é que faço  com a hóstia súbita  que dos olhos de minha mãe  me enfiaram  goela abaixo com um gole  de vinagre? Espero que seja salvo  por dentro da viagem

SOMOS EFÊMEROS NA MESA

Somos efêmeras moscas Na mesa do spider-man. Estamos presos pelo copo E a nudez do tempo  É pontiaguda. Quem sabe  O que nos soltará  no além-da-mesa. Cobertos por todo ódio de fora Esperamos o despertar Do inferno desta mesa.

SE O ESCRIBA MENTE

O que é que sente o escriba a se mentir, a tentar ir, quando a alma corta  o pulso, o que mente o que  fez, pensa ou pensava que devemos ter, que podemos ser em se envolver, em que termos ir como por prazer, o que perguntar, o que responder, o que decorar, o que compreender, o que qual e quando, ir comparecer, em qual seção, qual sentido ver no que é  se o escriba mente

MENTIRAS CONFIÁVEIS

Embora pense em Soraia  e sua saia, e ceta, não chora, fica sério e recompõe-se na atalaia de um bom poema, onde esquece  a boca séria e vária, em que a água  o molha e mata as frases falhas, que a liberdade empurra junto aos galhos diários, em que o homem pousa  e mata,  faz-se escravo tira foto de uma vã ação,  que pouco o move, escreve e como escreve  embora pobre despejando  sua sopa filosófica num chopinho com ovos de codorna enquanto passa a marcha a história

RAIZ MINHA

Ainda duvido desta dívida Com o Éden.  Mas só pra espantar essa incerteza, Tasco um beliscão nesta insípida Espada E com ela corto a maçã. Que pouco acresce,  embora parte da minha raiz.

POETA OU TEOPA

Coitado. Fodido. Dizem. Sim, vai poder ter uma mansão,  Aquela do pesadelo, disseram Um poeta entregue ao mercado Roupas novas Papel higiênico macio Daqui a pouco, um crítico será Esquecerá o poema e o jornal para a bunda Estará ganhando para ter opiniões Ainda pouco Para suscitar teses, hipóteses, halitose Ganhando redonda forma Defendendo a estética Seu estilo estará... Mas seu ser será? Poeta ou teopa?

SEM MAIS ASSIM ATÉ O FIM

Uma mulher te ampara como na gravura. Você olha pra cima e os olhos te furam, como no parque de diversões. O filme se passaria em 1920. Não haveria mais fatos. Só o olhar dela te esburacando a alma. Sem mais nem menos. As chamas da íris te aquecendo. E a morte tua de flor na boca, ....fina e cênica.

TRÊS FICÇÕES

Eram três clowns,  três ficções, e sopravam  bolhas de sabão. E antes ainda  empinavam pipa  por sobre o reino  livre. Mas tudo mudou quando entraram  num jornal de sangue. Passando por  uma fresta de ferida foram acusados e condenados  à pena de viver, tudo noticiado em grandes manchetes para todo inglês ver e deturpar.

CAS-CAS-CAS SOLTAN-TAN-DO

Você não sabe. Ninguém sabe. Há uma pedra enorme. Quase não respiro. Fausto me jogou. De Sokurov. Não tenha dó de mim. Quase não res...piro. A poesia está ago-go-ra assim. E não há APMA para Poetas Mefistofélicos Anônimos. Há abismos. Há abis-bis-mos. Mas há amigos. Mas há frescor Embora as descascadas paredes. A alma, vermelha Na altura do pescoço. A pedra é enorme. E dó-dói. Como o som afiado Das cascas soltan-tan-do.

O TEMPO AVANÇA, CUMPADI

Não há nada mais senão satisfazer A sede de obscura clareza De quem não sabe que a cura Do escuro não vira. Esperam que você diga: O amor é bonito. A criança é bela. A moça é um sol. No entanto, agora, Como ontem, Não há belezas intactas Entre as palavras e o real. Está de alma fechada entre costelas, Sem ressalvas. Se fodeu.

VIRGÍNIA WOLF

Virgínia Wolf, após ler-se na carne de Orlando, foi sumindo  ao longo do Rio Ouse;  sem se conterem, as horas iam lentas  como num filme  de Tarkovski, com as gotas salsas na retina  doce do rio. Sempre que um escritor morre, as horas choram infinitamente mesmo que ninguém veja. Mas com Virgínia inundaram a cidade, velhas demais para se controlarem, velhas demais para o espaço das coisas. Pra que esconder sentimentos? Cronos já estava morto.

A BELEZA DA PERGUNTA

Vivente de avatares de diferentes faces, horizonte vertical de soberba humana, Diabo dentro de Deus, Deus dentro do Diabo, luz dentro de sombra, dia  dentro de noites, o dado do açodado, o aço no dado em dedos, terra dentro do céu, fel dentro do mel, vazio dentro do cheio, ventania e tempestade dentro da calmaria base. Para existir, um deus  precisa ser por nós pensado , por nós de crenças enodoado, por cima, por baixo, de lado, UM?

FAUSTO COM PERGUNTOSSOMOSE

O que é o bem? O mal vem-vem? O sal das coisas doces? O doce das coisas-sal? Pra onde o degrau do vento? Do vento qual? Sou ou imagino ver-me? Estou ou imagino estar? Sou o esposo da amada. Ou da amada o par? O que posso sentir? Dor ou prazer? Ir Ou ficar? A beleza resolve? O quê? Solve? Coagula? Faz Sensações nas células  do poema .

REDEMOINHO POR ALICE

Vejam o redemoinho. Outro amigo morreu entontecido nos olhos por uma beleza impiedosa. No ginásio sorríamos comentando sobre a aranha dela bisbilhotando o banheiro das meninas. Vejam o redemoinho que ela provoca quando pisa. Há um coelho correndo ao seu encontro. Estamos protegidos por um fauno de devoção. Seus olhos são cardumes de pura sensação. Há um destino de xadrez em torno da beleza dela. Há cartolas em todos os cantos. Fazem mágicas  por seus buracos. Há chás todo tempo. Lenços no redemoinho. Então, talvez a gente deva atingi-la com pedras de auto-estima e constelações  de brio.

SENTIR PARA O FIM DO MUNDO

Os músculos doem do sentir que se virtualiza  na tela de ossos. O ser que já apagou  absolutos de pensar teima em deitar  fora dos relativos no entanto. Hoje, o tempo está morno.   Os músculos de minha alma por serem do espaço interior sentem metas vítreas. Há sentir suficiente aí para o fim do mundo.

ESCREVO

Escrevo para o vazio. Para o cheio.  Para o começo. Para o fim.  Para o meio. Escrevo como um jeito De traçar uma rota Interrompida a espaços Por um deus perdido Para não chegar logo A um lugar inverídico.

MINHAS GOTAS VÃO

Este poema não tem varandas. Não é uma casa pronta. Estou fazendo-o agora. Sento aqui nesta nuvem Que pra mim fiz, Ela não chove em mim, Mas eu chovo Assim Nela. Minhas gotas vão pra cima pra banhar deusas e musas de véu. Soando onde piso, Sem as vãs firmezas Do concreto.

UM DIA APRENDO

Um dia aprendo. Agora, não sei. Sei que vou de súbito. Como aprendi que estou a nascer. Um dia, recolherão Vidas que tive Do varal do tempo sem vento. Que mãos, não sei. Sei que vão.

OLHANDO PRA FORA

Atravesso o tempo Me equilibrando entre O sentimento E a razão. O varal arrebentou. Comprei outro. Arrebentou de novo. Minha consciência fugiu. Soltou da corrente. Mas quando teve sede, Ela voltou. Fica o dia todo, agora, olhando pra fora .

PARA A SULAMITA

Ébano dos carros do faraó, peço-te a penungezinha do amor, meu pelinho luzidio de amor tenro, pombinha verdejante de cedro, nardinho de vinhas amáveis, seiozinhos bexiguinhas de ternura, quero-te os abraços-colares de carinhos, beijozinhos como glóbulos de cânticos, sexo saquitel de infinitozinhos, crina doce de uvinhas da derradeira vindima, a que apascentes meu tremor secreto

VENS Ó MÃE, ACALMANDO

Vens no rastro das coisas permanentes no côncavo da tarde com manhãs de amor embrulhadas, que depositas na cadeira de ouro do descanso. Teus cabelos inventam espaços cachoeirando cachos pintados de infinitos eternos. Vens no fugidio do tempo trazendo cacos de espelhos em pétalas, pedaços de ser antigos que preenchiam vasos de lua. Teus cabelos são salmos  narrados  pelo luar na quilha  das caravelas atemporais, onde descobertas dão paz. Vens acalmando veredas e acelerando os córregos, dando tremor às rochas, curvando os lábios dos ipês, e ainda está longe a vindima anunciada na esquina do útero, enquanto uvas te espremiam.

NO LIMITE

A rosa que levanto dos ranhentos roseirais A rosa que levanto do que vejo nos quebrantos A rosa que levanto olhando os mendigos tantos A rosa que levanto ao desfolhar espelhos A rosa que levanto da memória em vermelho A rosa que levanto dos espinhos que acoberto A rosa que cubro de aço como espada que desfio enquanto abro o compasso no limite que me crio é a rosa que alimento com meus passos de água e papel

TEMPO AO LADO

Os cabelos sobre os ombros o poema espalha-os na nuca dos segundos o cheiro dela educa e assanha o nariz súbito bebe água ela e um pouco molha a boca entre as pernas e reza o amor o sonho enquanto passa o trem enquanto latem carros acendem os olhos da tarde que se acaba nela no ponto os cabelos alongam anseio e sedução e o poeta não é notado por isso o poema a lava a faz mais bela que o tempo ao lado

INDO AO AMOR

Indo ao amor sonhando ardendo tonto o amante cresce em paisagens novas vibrando nele o vento uivando entrega o corpo e a alma junto sem essa de morrer ou sim se a morte for viver até o talo de amor sem fim e desce e sobe e mede-se por jovem embora velho como um tapete intenso e cego aos pés do jogo onde se perde encontrado

MAIOR

O que faz maior um poeta bom ou mau fundamental talvez um bloco ou dois a mais ou sal com doce amor no parietal abdominal central um deus se faz poeta com nós nos braços de estrelas na quilha ou no varal de ouro sua tez brilha de ouropéis um tal caminho ou tao neutro variado inteiro ou parte do bem que leva ao mal ou mal que leva ao mar sem grupo ou grupal um bom poeta é o que o leitor completa normal ou anormal

PELE A RETINAR

Isto existe sem olhos? Olhos percorrem quando abertos. Delimitam. Julgam. Condenam. Olhos são os mocinhos. Olhos fechados ainda olham? Através da mente. Mas a mente são olhos? Olho é mente? Olho mente? Olhos remetem ao fluxo das coisas. Olhos inserem o eu em outros sujeitos. Se eu morro, olhos são cerrados, e o outro obscurece? Olhos dispensam pestanas. Olhos dispensam o piscar. Olhos são dispensáveis. Olhos são indispensáveis. O olhar caminha verdades visuais E mentiras coloridas. Sofro quedas quando me olham. Por vezes, me levantam com um olho só. Amigos e amores outros Olham contaminados de afeto E desenxergam. Ou veem O fundamental com olhar mudo De conceitos. O amor é olhar. Olhar? Ou pele presa em retinas?

CRESCEI......E MULTIPLICAI-VOS

Pisando os cascos, aluno mata  a professora  com um caroço  de papel em quetichupe. O Poder Conquistado nas Urnas come cachorrinhos de madame  e usa filhos de empregadas em fotos  eleitorais . Aos olhos dos leitores que nos curvam, metralhadoras cotidianas turvam e travam. É o Éden, não é?

SOBRE TOPADAS E ARTES ANTIGAS

Lembro da camiseta em tinta látex. O que quis com esse gesto? Um dos times era de camiseta vermelha. Peguei o látex e passei na camiseta branca. Ficou dura como armadura. Lembro de atravessar o vidro E a Idade Média E banhar de sangue o chão. Uma moça chorou por mim, Donzela negra no Schmidt, A carne talhada em rubis Queria apenas ultrapassar o vidro E seguir Mestre Rangel Simões Mago dos Livros Moventes A topadas no campinho da lira. Muitos não viram minha armadura. Mas Airinhos sabe, ele e seu pai, Sábio de Cuipaitaã, onde há Uma pitonisa ou vestal solar Naquele mendigo de ébano. Sua bengala não divide o Mar Vermelho Das indiferenças. Tudo mundo já disse isso. O tempo passa e ninguém muda. Lembro de adivinhar triângulos Debaixo das saias das moças. A tenda crescia sem cerimônia. E não havia dunas que escondessem Minhas vergonhas...vezes as esfreguei...

VIDA COM AMOR CRIANDO

A vida é um trânsito parado para um idiota numa fábula tosca dizendo nothing como o revólver do sistema que nos acerta quando andamos nessa fúria onde  só há contorno na sombra da palavra amor quando a dizemos criando-a na pele

FATOS TRÁGICOS

Os fatos são trágicos: Criança solta do alto Ao redil dos bípedes A bela retalhada no açougue Pelos adoradores do ar Exposta a criança no jornal renegado E eu bêbado de violência antiga Entornada com sangue Mentindo no Notícias Populares do tempo

PEQUENO PRA UNS GRANDE

O vento ensinando encruzilhadas ao fervor folhas golpeadas por sons de floresta braços acenando contra correntes de ar ao longe o trem se apequenando para maior ficar aos que o esperam lá longe

NÃO HAVIA ESTE MAR ANTES DE TI

Antes de ti, Sulamita, não havia este mar. Apenas sol-metade, lamita suja, la mitad de los tiempos sem suave ronroneo. Hoje, colocas fogo em meu oceano, e me faz riscar o pulso com ondas, olas que se van, libres como el viento, suavizando vinhos de vida com luar. Tua cor africana cria meneios na curva celeste do vôo de meus devaneios.   Antes de ti, Sulamita, as colunas do templo do ser  não eram sequer idéias para a fundação de mundos de papel. Hoje, a mirra de tualma, o nardo, teus perfumes, afugentam as raposas que roubavam-me as vinhas. Sabes da liteira de Salomão? Não entendo nada de rebanhos...

PRA LAVAR ENTRE ALMAS

Plim Plim. Choro. Lavar toda a febre  entre as unhas. Esfregar em sabonete  o lirismo. Tirar os rastros  de salgadinhos. De cachorro-quente  deixado frio. Deitar no sofá rangente, molas  perfurando as costas. Pegar o copo  no chão  com o café gelado e ruim. Olhar a TV  com tela plana a pagar  ainda em treze prestações. Tantos tintos discursos na TV! Pensar na ração,  no imposto com sumo. E no consumo  ainda não imposto. Pronto: um creme  pra lavar entre almas: LIMPOIESIS. Sorriso.

DANÇANTE POEMA

A carne amolece o tempo onde o homem se esquece atrás de uma nódoa feliz pra descansar e sofrer em falso de antes da criação vem isso, toda uma história de vencer. O mar, vencido, espuma, bêbado, meu relâmpago de pensar recomeços. Sou maremoto de desesperanças. Sou como um azul de leveza branca.  Sou um poema que dança muito.

AO ÚTERO

O que virá depois? Depois de matarem o títere, O último clítoris, Em um desses países Onde os líderes choram, Veneram naturezas mortas. Talvez dê esperança e víveres. O imaginar o carrasco No reino ou república Sem pescoço.

DEFENDER A PROPRIEDADE DA COSTELA

Se tudo começou como um roubo se alguém cercou um terreno ou tomou veneno e foi cercado ou teve suas crenças atadas pelo poder sacralizado como defender o patrimônio a propriedade da costela o emprego dos dentes caninos em morder o íntimo e o fora sob o direito que interpela com rodelas políticas em seu prato?

FICÇÃO-ALMA

Dois toquinhos de cigarro no cinzeiro à minha frente, a seu lado um lápis de olho de filhas olhudas pra doces, uma caneta deitada perto ama lápis de olho, e até trocaria de função não fosse o medo de cair nos mares da vista, e se nadar soubesse em olhos com lentes mergulharia, assim usaria  as lentes como bóias pra salvação da ficção-alma

OSSADAS DE ÁGUAS

Há ossos como os da alma que não se quebram fácil há ossos de árvore que deitam flores há ossos de estrela que deitam luz como fazem almas que não se curvam fácil ossos há no corpo do vento esclerosado parou no ouvido das folhas com ossos que ninguém nota estou pisando sempre nas ossadas das águas da chuva disto

ADJETIVAR SUCOS

Adjetivar a fruta-letra pendente, um olho passa o sabor da frase a outro olho, sobre outros olhos o cheiro do vento limpa as retinas, mostra a língua, cansada do calor das laranjas cheirosas que pulam de todas as fruteiras e nos sucos morrem

TABLETES DE SOMBRA

Prosa molhada cortando a dedo, a alma de papel, o sangue, a seiva, o asfalto no lápis, o salto das artérias, velhos túneis por onde entram glóbulos de todos os erros dos que escreveram antes, molhados  de tabletes de sombra

QUANTOS USAM A CESTA PARA EGOS

Quantos há reis-de-si-mesmos? Diz-me, pessoa boa, ruim, à-toa.       Quantos vão nas bibliotecas? Quantos usam linguagens que criam? Quantos em êxtase chegam no abismo? Ninguém aceita o anjo urinando pós-modernos cristais. O tamanho da alma é mais importante. Uma alma ereta não é brochante. Há uma conversa doida no bar do cotidiano onde as portas batem com estrondo demasiado e ao canto um braço estica jogando egos na cesta. Quem? Tento ser novo mas as asas batem nas fogueiras como cigarro no sofá antigo e o buraco se abre e tudo se dá como sempre se deu no rio da minha aldeia que só olho de passagem como o fio de mercúrio da Estireno que lambeu de passagem o dentro de um peixe que foi comido por um colega de serviço que morreu por dentro e por fora ganhando passagem só de ida para além do rio do esquecimento (será que o barqueiro da morte se aposentou?). Minha aldeota cultural é industrial e linda e tem um rio colorido em cada artéria.

SOB O SOL O POEMA

Observo que de mãos arregalando a poesia acordou imóvel em cima e suas bandas macias sobre a laje ofuscam até o sol na história que se altera Vejo os raios sobre suas espáduas o suor deslizante em seus vales de frases sua circunferência ressentindo o verso morno e passada a manhã, a poesia, sentando nos olhos fuzilados pelos fatos, viola a lei do real  como se estivesse sem bloqueador racional

IMPULSO SALGADO

Há pequenos sóis morando em grãos de areia. Percebo quando pisas na areia da praia - caosordem universal - e uma nuvem flutua de ouro em pó e sal. Então, o impulso dourado de um salgado beijabraçar-te.

POEMAS PULANDO SOBRE O MAR

Em derredor o tempo com sua proa e popa, a praia mesmo longe me toma os ouvidos de dentro com suas gaivotas e conchas inermes, e há redes que só pescam o ser profundo. Entre gaivotas e conchas, o mito da praia chora seu sal incessante sobre os ombros das rochas. Vejo poemas pulando sobre o mar, corpos vivos de ilusão, trançando águas-vivas, causando doce júbilo nas algas, e velhos marinheiros palitando com tridentes. Percebo-os de sonhos flutuantes, entre presentes espumas de desejo, paisagem de pintura a óleo, o passado lhes enternecendo.

ALMA À QUEIMA-ROUPA

O tempo, ponteiro, torto teclado Nele as horas Que a vida lavra. Na internet, montam Sarcasmos. Fotos. Os truncados rumos Desnivelam ratinhos Nos dedos. Comedores de arquivos E falhas Aguardam a hora do amor. Que fazer, se o fato Curte alarme em pó? Me mataria se não me atingisse A A lma à queima-roupa,  Compartilhando-a.

COMO PEIXE-PÓLEN

...Sempre aparece e deixa marés no pensar. Se um poema voa ao norte da ilha, deixa-o voar como pólen de alma. Mesmo inconstante, sabe ousar corais que guarnece de infindos cais. O Silêncio traz.

ROUCA ALMA

Rouco ser eu lego. No solo escrevi Poemas com ego. Não liga pra isso, É de poetas vício Cego, dores curvo, E assim nadando Dissonantes sons, Vou ensurdecendo Minha idade média Com renascimentos. Perco os recheios Da alma, seu selo, Com a casca ao meio, Rouco ser trafego.

AO LEITOR QUE MEREÇO

Eu só escrevo, não quero mais Do que o teu contentamento. Não quero ser desprezado, Amados nos festivais. Valem mais os elementos Que a lua cria em teus olhos. Valem teus sonhos fininhos Que a meus sonhos vigoram. Valem os teus comentários Sobre os poemas chorosos. Não escrevo para a brisa, Não escrevo para o vento, Mas quero teu concentrado Saindo do coração. A minha paga É sentir o solidário fermento Quando vasculham meus versos Teus olhos, febris acentos, Que minhas letras dispersam Por mais vivos sentimentos, Ou não, se até mesmo negam. Eu só escrevo, escrevo, E escrevendo, padeço Por não chegar onde devo Por ti, leitor que mereço.

CALOR DO INFERNO

Passei no corredor. Uma bola a Preta. Corre e late e me contenta Fazendo-me esquecer A gravidez de uma idéia Que abria suas pernas Entre câmeras de cinema. A Preta vai e vem. Está com sede. Senta. Saudade do banho Antigo de mangueira. Uma sede louca. Preta lambe os corvos Que me bordam girassóis nos pés.

MAIS UM DIA DE ATRAVESSAR

Atravessar o dia e seu jogo, embora as tábuas soltas. Ouvir sobre fé e manteiga e amor na televisão a cabo e jogar. Falar sobre a aderência na frigideira. Memorizar o gesto que precipitou-nos. O rosto da motocicleta que cuspiu na calçada. Num prato de carne seca com fofoca. Com os dedos no torno, o trabalhador amansa. Ao final, vemos a TV chicoteando-o.

EU SOU DOIDO

Está rindo por agora? Você vai ver, eu te lasco, E terei sorte lá fora Cheirando a tenro churrasco. Vou ser como Bora Bora Que só fez som do fodástico. Você vai ver, dor de ouro, Vou ser bom qual mago “chin”: Vou fazer brotar tesouros De solo ao sul de Pequim, Onde fazem mil agouros Por eu me afastar de mim. Vou fazer dez mil sonatas Pra um caminho em Compostela. Por seres Dor, estafada Deidade medieva. ...Eu sou doido? És doída! Mas és dor que o poema envida.

DOCE AMOR CHICOTE FORTE

Doce o seu chicote, nos adoça e salga, a ferida rasga, bem fraqueja os fortes. Eis que olhos tropeça, por cegueiras ter na ilusão que causa penetrando o ser. Nós, do sol servis, ficamos felizes só de exibir-lhe nossas cicatrizes.