Pular para o conteúdo principal

Postagens

Mostrando postagens de agosto, 2014

FEBRIL

Escorrendo, finitudes no rosto. Escorrendo, baratas soprando na orelha dos postes, Fofocas de grilos, Promessas com poças, E o coração fica febril  Quando ela abre o guarda-chuva.

DO INENARRÁVEL

Inenarráveis vermes de angústias A passear entre homens e seus infernos, Dispostos nas brechas das almas. Pouco interessa às máscaras urbanas Sua volátil argamassa de hipocrisias. Dois homens de pé perto de um carro Fazem acordo para ganhar milhões. Farão muitas entregas Regadas a "papus corruptus". Nas praças onde sem-teto dormem, Estátuas acarinham cães. Onde a indiferença faz graça, Inconsciências olham para os lados E escolhem um partido político.

FACES ENGANAM O ESPAÇO VAZIO

No aquário há o vazio depois da morte  de um polvo de plástico e dos peixes. A mulher limpa o teto das teias de aranha. O homem mergulha no papel onde nada até de costas. Escritor? Abraços falam paredes de vidro ao oco dos peixes-fantasmas. Faces enganam o espaço.

PERMEANDO

Fruto preso a meias Lua em meio ao céu Gesto meado no ar Ave em meia casa Corgo em meia mata Língua meio apensa Fogo em meia água Meio oceano e meio Meando mudas mágoas Soco a meio espaço Meio-chifre atesta Pedra em meio ao rio Onda-meia no entre Rocha em meio frio Flor de meia brisa Desarmando ameias Meio-vôo o anseio Que permeia as veias QUADRO ACIMA DE ANTONIO DE FELIPE

PÉS EM LUZ

Os pés de barro lutando juntos contra as águas anômalas. Assim, assim, o centro em pus irradiando luz no esqueleto.

GAZA ENFAIXADA

Gaza foi sangrada pelos fados de que deus? Um deus com gazes nos olhos seus? Cagou acaso um cu supremo sobre a faixa? quadro acima - Dioses Andinos - do artista UMONT

ÁRVORE-SER

O pisar além da soleira descreve corpos e almas o ser branco relê o dia o ser preto é de angústias por dormirem na onda do mar suas memórias de águas-vivas lavam as canecas na água da chuva Fica isolado o adolescente que pede para ser Árvore-Ser aceso de músicas

NA PAREDE ENCOSTO

encosto ouvidos na parede às mulheres mortas elas arfam cansadas regras as matam todos os dias e os barcos a vela sumiram todos os monstros marinhos converteram as algas subindo pelas paredes

NÃO ME PERCO DE VISTA

tento deitar aqui nesta cidade gráfica aguardando o grifo há barulhos diversos nesta cidade inerme alopécia nela lixo tento disfarçar o anseio nesta aguardando outros que me digam certo o caminho incerto não me perco de vista enquanto o vento se espedaça no tempo que o afoga

LEMBREM

Lembrem de todos, não só de mim cujo fim findará o gordo desejo de sins e o arremedo de sentir-se eterno

A RUA COM SEUS PEIXES

....A rua com seus peixes afiados com suas barbatanas espelhadas canecas em navalha cacos de emoções com algas tombando com sua fome de planctons com sua sede de abraços atirando com sua extensão ilimitada no frio com suas pedras rasgando com seus pneus de arestas fogo nas axilas das esquinas falsos grupos de azuis falsos elogios sob postes falsos jeitos de permanecer na agulha das ilhas a rua e seus becos com seus sinais de escuridão com seus verões elevados com seus sóis de solidão e dor física no mesmo local do cérebro doendo na barriga aberta do papelão mijado

CORTE DOS DIAS

Durma. Acorde. F(aça uma) ode. Refaça. Cão! Sente! Concentre. Varie. Evite. Estimule. Cite. Crie. Trate-se. Tome. Afaste-se. Dome-se. Consiga. Hoje não se come. Prossiga. Mate-se? Não, forte. Adapte-se Ao corte de sempre Dos dias.

PUNIDA IRANIANA

Quem é que entende  a partitura da chibata? São sons abafados,  estalados em dor. Noventa chibatadas  numa iraniana.   Sons musculares. De outra mão que masca a chibata  como a carne a masca. Uma jovem com rios de sangue de proibida navegação.

POEMESPETALAR

A alma, sendo túnel, Encana os ventos Do corpo verbal. Uma alma gripada Motiva o súbito estrondo Que o poema assoa. As distrações do corpo Podem levar a flor da alma A poemespetalar.

EMARANHADO PARTIU

Ele atou-se em mar atávico, Depois de fartar-lhe o mundo. Foi nadando em seus entulhos. Depois de quedá-los, mudo. Mergulhou. E seu mergulho Desfechou-o muito fundo. Ele fingiu-se em seu nada. Depois versejou-se em tudo. Foi descorando seu ventre, Desatado e rechonchudo. Foi inchando na corrente, Foi inflando a flor apática. As plantas sub-aquáticas Fizeram-se-lhe de pentes. O mar morto de sua vida Bebeu-o, indiferente.

ENCANTO LEGAL

Em cima, o dono do imóvel. Paguei a ele o aluguel Com um acréscimo legal. Não legal legal pra caramba. Do lado, dois vizinhos legais, Agora sim legal legal mesmo. Não sonhasse com ele me despejando, o dono até seria passável. Legal o vizinho lá de trás. Ele tem uma irmã que canta. Ele tem uma irmã que encanta. Eu tenho mulher que me encanta. E duas filhas que me encantam. Me encantam pra caramba. Um dia desses me transformaram Num pedaço de céu. Fiquei azul e chorei. Chovi.

VASARI E JOÃO

Vasari era de Arezzo, isso é bom saber, onde um homem nasceu. O João é de Caculé-Bahia, isso é bom saber, onde um homem nasceu. Onde um homem morre, também é bom saber, seja Vasari ou João.

RETINA ESQUERDA DE HORUS

O teu ajardinado sorriso Para melhorar as fases da lua, Espantando o frio da alma-via Para o sol que beija umbigos Do ser na praia de an(versos), E eu, me mantendo à distância Do teu olhar que cega flores No meu pensar, a versejar-te Na retina esquerda de Hórus.

SEMPRE ESPERAM

Penélopes sempre esperam. Sempre tecem. E no dia seguinte destecem. Ulisses sempre viajam. E voltam. O ralo do banheiro sempre enche. E esvazia. O teto sempre cai sob chuvas. Mas a chuva passa. É difícil encordoar o arco mas não impossível.

EIS QUE FAÇO UM JARDIM

1 - A LUZ Eis que, então, faço um jardim. Revolvo a terra para que fique fácil pra você. Ali plantei minhas flores para nossa luz surtar. Ali, onde o espírito do dragão que libertaste dos olhos a afoguear os meus voa a calcinar a alma das coisas. 2 - AO CORTE Deixo este canto para que o corte. (Por escolha. por sorte.) Diz Rita Lee em meu jardim: -Pura prosa A poesia da carne. Dança Rita no youtube. (Lembra um pouco Dulcinéa.) E eis que este poema também fica quixotesco. (Moinho para sempre De sonhos feito.) 2 - AO LEITOR Mudo de Rita pra Springsteen .

PAREDES

Sempre tive que desafiar paredes. Nunca as desafiei muito, na verdade. Lembro de uma, certa vez. Queria fincá-las com os olhos. Mas os olhos numa parede Ficam moles. Envesguei os olhos por dentro.

SKINS SKINS

Dor à flor da pele flor de dor na derme força a por no cerne eis: pede excele Amor na dor adrede dói no led e o fere em luz que pouco adere excede Dor à flor da pele olor fino assédio ao grito que impede- o Amor-dor afere despelando adoece e mais dor adere agrega e o tece

DEPOIS...

Depois de amanhã, estarei con- victo. O Victo é o cara. Hoje, só trago nacos de dúvida. Minto. Vejo muito as baratas em poesias secas, manchadas do vômito das musas preguiçosamente contemporâneas. K diz de sua paixão por aquela guilhotina-para-pais. Às vezes, a lambia como se lambe um sorvete como o melhor do mundo. Às vezes, a chupava como se chupa o chupe-chupe da Dona Maria da rua por aí detrás. K diz que estou ficando poeta. Acerto uma a cada ano. Quase um chato sopa-de-letras. Diz que vê-lo em plenas 23,34 horas é insano, ainda mais com luzes fluorescentes. Mas eu estou só fingindo. Manda que eu vá me catar. Mas lhe digo que não sou pulga autofágica. O que é isso mesmo que eu me inventei? Depois de amanhã, não o verei mais, porque estarei curado. Depois de amanhã, tomarei remédios de não-ser. Há amigos que me doem quando o poema se espelha e se masturba. Querem que eu seja sempre o da estabilidade estilística. Depois de amanhã, estarei convicto de estabilidades. Depois de a

O SANGUE

Deuses vivos e mortos Vomitam em guerras  Nacionais e Internacionais. Nem ouses vomitar aqui Ó Deus que me fiz! Baratas pedalando no lixo nem me olham nem me acenam nem desdém sequer me dão. O sangue só envergonha Quando temos vergonha.

O TRÁFEGO

O tráfego cruzando com gentes: assim as moscas nos solos e paredes. Um homem como buraco na parede diz que a vida não é um romance. A náusea desaparecerá com a canção se pescarmos seu mar adentro.

A SECURA NA LAGOA

A secura na lagoa de nossos valores. Por isso somos maus à beça. Podereis objetar-nos. Aliás, herdamos no templo As chagas que ainda fedem Dos Inquietos. Rótulo em sangue ferve em nós. Junto às chagas herdadas, Se nos apresentarmos perante vós Aceitareis sem estas chagas? Só nos exibimos por vossa causa, Para bem povoarmos os narizes. Já infectamos todo o vazio. Assim, somos os herdeiros podres Para esta civilização arruinada, Sem nos perceberdes. Somos herdeiros daqueles Que enforcam ventos pescoçudos.

FASTIO AO SOM DO SOL

Quero cobrir o som do sol. Meu senso é cinza agora. Sensível ao cão que morde-nos os miolos. Ao gato satírico que chora em francês. Ao rato de dentro que sofre pauladas. Sou a dúvida quando vou e chego. Louvo ao ausente de modelo e esquema. Ao que chora no canto a busca de si, Pesadelos escorrendo como papinha, Sou sensível, acredite, às certezas, Embora elas fujam todas as manhãs. Tenho até de comprar uns maçaricos para soldá-las no corpo do ar.

MÁGOAS PICAM

Asas de eróticos insetos. No substrato da memória. O que há-de Deitar mais habilidade Ao ser insetívoro? Quem há-de ferver-me Os cubos de mágoas que transbordo?  Mágoas picam. Picam as folhas mais suculentas do ser. Um dia mando às picas as lava-cus da mágoa!

ATÉ QUANDO A MALDIÇÃO DE CAM

O Poder oferta o cálice, Pagará no alto tálamo À Morte da Infância? Sabe-se? Pra onde o perdido gesto Aposto nas ruínas? Que cabeça posta à festa? Onde o esperado regaço? Os argênteos restos Da lua devorados Por neo-ogros banhados Em leite e amargo fel. Até quando A maldição de Cam Do Tio Jacó e de Eretz-Sam sobre Palest?

SE VIR QUE VENHA

Se o poema vir, que valha um vizir, se o poema vir, que soe ao sair, se o poema vir, que amolde ao mentir, se o poema vir, que se erga ao surgir, se o poema vir, que suba ao cair, se o poema vir, que chore a sorrir, se o poema vir, me ensine a intuir, se o poema vir, zênite nadir aqui e lá, curando, a ferir