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Mostrando postagens de setembro, 2014

NO ESPELHO MORTO E VIVENTE

....Há quantos dias lhe chove? Sua árvore encharcada? Mas a chuva no espelho Faz sua vida afogada? Mas que seu ser tem a ver Com o vidro que o reflete? Se seu cérebro em sinapses de solidão se traveste. Quer ser jovem, mas já foi. Será que nasceu idoso O seu ser, caco de espelho De meu eu, de d(eus) guloso? Será que em si vai chover Como no espelho molhando? Ao espelho o eu a ser Mais se reflete, eu/stando...

DESENTENDO CHAVEIROS

Você me diz  que não sou louco,  só um pouco, que não diferencio Cleópatra de Creio em pátria. Que vejo anjos de coágulo nas pernas fugidos do Inferno-São-Os-Outros. Você me diz que é tarde para mim, mas quem entende os próprios chaveiros? Adianta exigirmos do espelho o normal de decência lógica? Você quer me atar com absolutos e embaça minha laranja na fruteira. Você afirma e eu fico surdo, pois só o relativo pontifica a mistura do meu dia com feijão, e um anjo escabelado se estica na rede de sarcasmos que me dão as mãos dos sonhos que mais vão quanto mais ficam no chão.

TENHO DE QUEBRAR

O rosto já não espelha. Endureceu após o dia. Há um deserto por cima. Sou camelo e cachoeira. Tenho vinhas de estresse. Antes, escorria pelos braços, tronco e pernas. Tenho impressão que esvazio farpas. Agora, olho o espelho. E lembro que não posso olhar por muito tempo. Tenho de quebrar oito horas.

O NAVIO

Um navio. Entro. Vejo o mar ao longe e perto. Sujo de óleo e homens. Dentro, uma piscina. Gente gorda, gente fina. Foi dia de visita. Saio. O navio sonha. Não, navios não sonham. Eu sonhei que era comandante. Que cantava aos tripulantes. Aos visitantes. Aos pagantes. Sai. Fiquei só com a praia. Nem moedas para um sorvete. Passam banhistas. Tento esquecer o navio. O navio tenta me esquecer?

SE EU ME CHAMASSE SETE-FACES (a Drummond)

Vejo gente multiplicada por gente sobre gentes.... Pra que tanta perna, tanto movimento, nada lento, tudo rápido? Poucos cultivam o bigode. Só conheço o Tião e o seu irmão. Creio no segredo do sonho quântico. Somos eternos em processo. Eu mesmo me abandono a devaneios sutis. A galáxia é vasta. Meu coração adora um torresmo com cevada. E ainda me comovo com a morte na TV. Se eu me chamasse, eu me atenderia. E se meu nome fosse Raimundo? Voaria com solução De formicida e rima. Ou não.

SUOR EM CUBA

Em Cubatão, há o suor na avenida 9. Há movimento abaixo e acima. Há ambições, sonhos. Moças almejam moços tranquilos. Que as amem e lhes deem filhos. Nem sabem por quê o útero clama. Mulheres amam ou não. Homens não amam ou sim. A solidão clamando. Pardais quicando. Há quem ame o sol e a lua somente. Há maquinismos. Houve poluição. Alopécia nas serras. Dizem que não há mais. Penso Cubatão, depois de tomar banho. Amo esposa e filhas e ilhas findas. E aos amigos, sóbrios e bêbedos, De religião, política, teatro, E levedo. E a mãe e irmãs, Desde cedo. Amo a cidade velha. Há quem ame às sementes Do amor, somente.

POETA DIZEMOS

Eu digo que sou poeta. Um amigo também diz. Um outro é reconhecido. Um outro se faz notório. Cita frases e se diz feliz. Lobato disse. Disse Rimbaud. E vai citando Todo lampeiro, Mas viver que é bom? Por que fazemos isso? Isso de nos dizermos poetas?

OBESA POESIA

Quebra a vidraça do verso a poesia que faço querendo exibição. Mas foi presa. Quem mandou ser malcriada? Mas ela não foi. Quebrou a vidraça do verso por estar obesa de universos e quase não caber no quarto de papel em que a deixaram.

DOR NO BOLSO

Não é o vento. É o ventilador. Escuro. Bati o nariz. A conta de luz No móvel. Desligar o vento. Do ventilador. Há dor no bolso. E nas ventas. Escuro. No claro De amanhã, Pagar a luz Por código de barras.

REJEIÇÃO

Vinha o outro-eu comigo. O derrubei no abismo. Pisei sua bondade Com uma canção difícil. Depois, o outro-eu subiu. A sua bondade com hematomas Se curou e continuamos por aí.

ENCHER OU ESVAZIAR

Embora o poeta gargalhe, há verdades só no corvo do varal da alma, que martiriza o papel com lágrimas de peixes picados por felinos mortos e por filósofos pescadores com veias incendiadas de verdades em pratos feitos e frases prontas para se atirar e não deitar ou andar encher ou esvaziar, enquanto lê Edgard

CARNE ALMA DO PINHO

A carne na alma repassada com beijos e cheganças na alma é carne retesada de violões A carne na alma principiada com uivos gritos de amor na alma é carne suspirada de violões São cordas na carne invocadas verdes nos dedos do pinho na alma a carne o vinho dos violões A vida por vezes é feita da carne da morte e do canto a vida inexiste quando a apartamos dos violões de dentro

UMA CANÇÃO Á MÃO

Uma mão  com o segredo do jogo de recriar o verso-istmo Uma junção com o mistério de aguar o desejo da virada do tempo Uma canção em terra com o dom a sina de encantar a morte de baixo pra cima Uma no ar com o infinito e eterno jeito de sorrir corais de vida

Ó. AQUI. NO AUSENTE CORAÇÃO.

A notícia está velha. Mas o coração ainda diz que Velhos, jovens, mulheres, crianças, Tornaram-se borboletas. Não, na verdade, ressequidas num último grito. Nos últimos meses, a contar para trás do Pós - Guerra, Alguém enriqueceu. Alguém perdeu. Alguém foi enterrado sob os olhares da Lei. E as crianças morreram, embora a Lei Sagrada Cuspa em Caronte Ressuscitado a cada tiro. Nós até choramos. Limpávamos os nossos narizes. Hoje, as crianças doem. Desde ontem. Aqui. Ó.

VERDUGO

O verdugo está em cada um de nós. Vive a degolar nossas verdes camadas. Sempre alimenta nosso aquário de morais. Esfarela nossos ingênuos desejos e perguntas. Nas manchetes de dentro, queima nossos espelhos. Como dói o verdugo dentro de tudo!

PEQUENINA E GRANDE

Pequenina  é a morte na espera de sorte que revivo para as escalas de Odisseu urbano para que infinitas vezes repita em ti meu itinerário de auroras e crepúsculos Grande é a morte quando fecho os olhos às sereias antigas e deixo escapar sem música auroras que deslizam em teus braços ansiados   Pequenina é a vida para o que tenho de viver-te Grande é a vida insuficiente para amar-te em toda dimensão eterna de árvore a suar pelas raízes

SOU SER SOM CARNE

Sou som embora não sou enredo embora roto sou tempo de um espaço por esticar de amor na tua derme atemporal Ser pedra sempre dura conceito desfeito na cultura do maleável Sou vento embora desventre o ar com chagas adrede escolhidas no verso por esticar Ser pedra nunca mole frase imersa no por chegar daqui onde gero o amor dentro dos teus seios a forcejar nos mamilos do papel, lençol onde te crio espumas

HABITAR ENTRE OS DEDOS

Habitar entre os dedos dos teus pés ser de ouro embora a areia ser de prata embora as águas ser de fé embora o ceticismo ser por trilhar teus lábios como um sonho pedra de um outro universo onde reinemos com saliva alquímica Habitar entre os átomos explodir o desejo na pele estendida sucumbir ante o espelho de paixão rezar embora a ausência clame além de mim conquanto em ti se presencie com ar de fim o começo de tudo e nada

VISTO-ME NU

Visto-me do amor e te como e te bebo como uma canção sorvendo ouvidos Tiro-te a pele com a faca de meus beijos amacio-te a alma com macios gemidos teu cheiro sinto com os lábios e a febre de meu desejo Visto-me de amor e passeio em teus olhos como um pássaro achado nos penhascos do anseio Tiro-te o medo e me cedo aos teus dentes e me chupas o céu e me lambes o inferno como música infante e ficamos nus da própria nudez

IESSIÊNIN FEZ UM AVIÃO

Ele fez um pouso, como nem todos podem ser voos ele fez um pouso dentro, sem nome O difícil: um maço de paz interna Realmente, a morte não é difícil como beber deste papel jogado, nunca um papel morreu tão vivo, viveu um pouco rasgado pois quando a gente cria o rasgo permeia às vezes por equívoco do contramestre do risco à deriva, que entorta enquanto vomitamos a tempestade inopinada, e chora rumo àquele país interno mas no meio entre um antes e um depois entre a testa e o queixo não fora dos mapas da emoção navegante

NINGUÉM TE PENSA

Um deles te chuta com toda a força, és estéril e lisa, esfarelas um tanto, um moleque te pega pois estás numa cidade como São Tomé onde o turismo suja as ruas, mas um outro rouba a ti e corre como um louco de encontro ao súbito e a mão afrouxa e tu escorregas para a lama de um terreno cheio de poças não és semente de ti nada sairá com tendência ao verde, fosses calcária terias cores diversas mas és pedra simples, apenas mero calhau sob ação de chuva, vento, gelo, calor, frio, e na noite ninguém te pensa pensou ou pensará

A FORMA INFORMA

A Forma informa que perdeu a receita da transformação e esclerosa ora velha ora nova literária ova a frase em formol não goza e o suor e o sonho molham a palavra para sempre embora a foice a persiga esfarele a fôrma do ó(bolo) e seu recheio a cidade segue imune a isso chove nuvem com canela na língua da noite

AS ALMAS QUICAM

Torcer a dor De arre(medos), Noite, tarde E cedo. E após fazer Os nós, A prender Bem dentro a voz. Velar grande Incêndio hiante Na beira do tempo De aldeia. O entrelaçar Da voz doída Também é Foz de sentidos. Umas nas outras As almas quicam.

LINGUAGENS

Quando avançamos as linguagens, os lábios chegaram atrasados. Porém, nossas almas anteciparam-nos no verbo. Quando enlouquecemos as linguagens, castelos surgiram no vento com frescor e perfume e sonho e nos atiramos como galhos quebrados no som em poças.

AFRONTA

-Se catem, bando de otários! Eles ouviam-no o descaso. Primeiro, o espedaçaram. Um olho caiu no vaso. Pedaço da boca danou a falar, Ficou irado o populacho. Despeitados, com alarde, Lhe juntaram pro despacho. Espedaçado, riu. Feiticeiro um tanto. E enquanto salgavam o poeta bruto Teimava ao canto Seu dedo médio - fodam-se, putos!

BALDE

Pai, sabe aquela roupa que coloquei no balde pra descolorir um pouco? Vai correndo, pai, torce ela e põe no varal. (Fui, bêbado, torci a cadela E a pendurei. Quem mandou  Dormir no balde?) tela acima: Menina segurando um filhote de cachorro, óleo sobre tela por Daniel Ridgway Knight (1839-1924, United States)

O ANSEIO EM MIM

O anseio, em mim? esse é bem profundo. No meu eu sem fim acabou-se o mundo. E hoje é só domingo (MESMO FERIADO) em pé a poesia finge de apagada, mas atenta ao sonho brilha ensolarada, no poeta-fanho o verso faz giro mesmo pouco o ganho, brada contra o ouro falso em touro doente, bate ao vento, o sente. E virando a hora sob fatos/fotos do cotidiano o domingo é o tal (FOTO DE JORNAL)

RUA DE ILUSÃO

Gosto de dormir. Quando estou pegando no sono, Tudo que pensei no dia ido escorre. Vejo irem pela escada as frases do dia ido. Demoro a dormir, pois isto me chama a atenção. Não sei se ocorre com todo mundo. O que pensei vejo descer os degraus. É o que querem que eu pense as estrelas'? Sei que voltam quando durmo. Não tiram os sapatos. Se enfiam debaixo da cama. No lugar do bicho-papão. Que ficou seco. Se vestem de paralelepípedos e me rendem À sua Rua de Ilusões Poéticas.

DIA DE FEIRA E MEXERICA

Fomos à feira, éramos dois a apertar tomates, laranjas, testando a consistência do que iríamos comer. Lá no fim o tempero, pimenta com cominho. Ela sabe para que serve. Já alho, conheço bem. Dúzia e meia de laranjas. Para suco acompanhando Uma boa refeição de carnes. Laranjas, uma dúzia. Fomos à feira, éramos dois. Quando chegamos, Seus seios eram duas mexericas. Chupei-os, como sempre faço Pra fortalecer o casamento. acima pintura - Arimatéia Feira II - de JOSE ROSARIO

LOUVADAS MULHERES

E assim foram condenadas à beira do tanque das inconsciências. As mulheres de Atenas, se lembram? Faziam, atendiam, e ainda fazem cafuné, atendem fomes. Não percebem a terra até o pescoço, que lhes foi entregue enquanto sorríamos. Como que é? Estão me tirando? Vão dizer que não... E aquela terra então, aquela invisível, que enterra a dignidade delas ao recato e doçura do aço? Demos-lhe o Véu. Telas Onde pintam O Pai, O Filho, o Deus Virilha. Nem perguntam sobre nosso muque. Conseguido por lançarmos pedras ao seu orgulho de existir. Pedras pesadas que nos consomem quando as atinge. Pedras que lhes atiramos sem remorso acertando em ricochete nossa alma ou alguma coisa parecida. E nas igrejas algumas pedem perdão por nós. E ainda lavam nossos machados com o corte de seus pulsos. E então a gente segue, bons pais, bons filhos, bons irmãos, fazendo poemas louvando-lhes o materno dom, estendendo-lhes o cavalheirismo, que se impõe mais forte e assim as faz m

O RITMO DA RUA

O começo da rua... e tudo hoje está tão deserto: uma folha que voa ao vento, um dente perdido na boca de lobo a focinhar restos de chuva e papéis de sorvete, um doce pé-de-moleque sangrando, mordido, uma pipa ralhando com o vento travesso Estranho o começo da rua, e tudo está tão longe, embora tão perto do lixo no saco aberto, e, depois do acidente, o resto das orações encostado na parede final Antes do meio, quando tudo começou em idéia, o ritmo antigo era dela, a Justiça, e ninguém estranhava as ruas