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Mostrando postagens de outubro, 2014

O ÓDIO TEM QUATRO LETRAS

Somos nesta guerra quatro letras que explodem frases, socos acres bem no verbo que se adianta nas crases. Um corpo sofre no outro, o outro mais quer, quebrado, se no catre há um que vence, é por conta do arrebato. O ódio no amor se trata, o corpo n'alma se plasma, somos do alfabeto a nata. Embora a paz e o pão ázimo, nesta eucaristia quatro letras dão sangue e sarcasmo.

QUASE MEIO

Um passo quase meio Sapato quase feio Pulando quase em baixo Um amor quase cheio Casório quase feito Quase branco e ela vestida De um branco quase preto E um noivo quase em dívida Banquete quase quente Da sogra quase exótica Não fosse a quase ardente Neta quase gótica Ao fim quase começo De um dia quase claro A noiva quas'dispensa O noivo quase raro

FLOR QUE BASTE

Por amar muito este amor que o canto de carne e alma ao fundo do teu ser, e por guardá-lo todo em teus encantos bem mais te amo a me submeter. Eis o milagre dos encantos teus que faz escravos de escravos natos para servir-te mesmo após Morfeu fingir-te a Morte com manhas de gato. Amo-te como um David-Golias, Anão-gigante, corajoso traste, Arcando pesos, mas com alegria. Me faço rio em fúria, embora afastes, Roubando as flores que se agacham frias Pra que só tu seja a flor que baste.

SONETO DO SILENTE AMOR

O Amor encontra fala que o expresse? E a fala que o expressa mede a Alma? Será o atroz silêncio o que mais tece O Amor de duas mãos que bem se espalmam? Profundo é o rubor que atinge as nuas faces cujo amor preenche o olhar, tornando vã a fala que insinua saber bem mais por verbos manejar. Sempre temi palavras sobre o amar Que mais profundo é no estar calado, Amando, sem falar-nos, a tocar. Que o amor sem fala é mais falado Pode-se comprovar no nosso olhar, Que escreve e lê no vão silenciado.

SONETO BANDIDO

Não demores demais, venhas desnuda, Que a veste é uma coisa que atrapalha. Também não fales nada, venhas muda, Que o tempo esgota e esta memória falha. A minha língua lamba bem a tua Nos buracos das bocas encantadas, Depois, que eu desça sobre as tuas luas A minha língua bem caramelada. E assim eu volte a espremer tua face, Numa trilha sonora de gemidos, Minh'alma na tu'alma a misturar-se. E, deitados na grama, em vão nos cacem, Em vão, pois nosso amor é bem bandido, Fugindo, para assim mais sequestrar-se.

PRECISO REMAR

Preciso consolar a vida cheia de morte pois seu choro aos meus ouvidos sorri mais do que suporto Preciso consolar o barulho cheio de silêncios pois seu choque vazio me faz trêmulo nas orelhas Preciso remar entre notícias cheias de sinais rubros e sentir a morte morar nos meus irmãos para registrar a alma na carne do alfabeto

APESAR DE TUDO SOU

Apesar das algemas sou liberto como um poema incerto na argamassa do espaço Apesar das grades sou liberto como traço em tela de um olho dormindo Apesar do estilete sou liberto como um cabelo ao vento ou um alheio sentimento

PEDAÇO DE FOME

Pedaço de uma fome qualquer e com sede vai com cesto ao rio-mar buscando estilo mas o estilo é uma velha lenda que o poeta copia e preso fica ali sem pérola própria com cesto cheio de furos Mas o que é a poesia? O que é o é? Vou comunicar: não agora que estou com palco proibido ao real e com uma voz-cópia Eu queria fazer um poema sobre a poesia mas nunca fui até ela ela é que veio até mim sem pedir licença pra engomar minhas roupas da primeira vez me enterrou minha mãe não teve tempo de me pentear Quando vi a flor da poesia, ela despetalou minha interioridade mas era cópia de uma cópia de uma cópia de um escritor com estilo e que não muda nunca

O MITO ME ABRE AO NADA

O mito me abre os olhos mais que ao fato à faca-dicionária cheia de orvalho O mito me abre a alma mais que ao sono, é quando enxergo o signo como não-ser O mito me abre o corpo da palavra, é quando só com meu nada posso lavrá-la

SEMPRE CAI

A carne sempre cai quando a alma esvai ao que devora o amor E no solo vai ganhando frestas poluindo envenenando queimando com o ácido do seu descante o que devora o amor Sempre cai

SE EU PUDESSE O FIM

Se eu pudesse  escolher o fim o quereria  com um ar de começo nas bordas de anseio de teu beijo e fujo eu do centro porque na beira do rio há mais verde curvado às águas que passam nos teus lábios dentro às pedras que se arrepiam se encolhendo de frio como quem brincam oferto este frêmito vermelho no assento

O FALO O FAL(ÓPIO) A FOME

Homem de ferro, quantos caminhos se sou homem de lata e quantos caminhos  se sou homem de retalhos de penas de pedra de poemas? Quanto sites a clicar até chegar a individuar, agregar, quantos medos verdades mentiras repetidas quantos furos nas capas do Poder digital é preciso fazer? No tribunal ópios-fala piam sentenças                                                                                                                               

AO SALVADOR DALI

Borboleta e relógio deitados na mesa Velas levam Rinocerontes na face da guerra Um grande bigode dali a Narciso Os seios pisados no tempo da girafa em chamas Barcos ancoram costas nas esferas Faces sustentadas de olhos arregalados Formigas rezando ao esquizofrênico deus amanhã

RASGAR UMA REALIDADE OBESA

É fácil escrever uma pedra nome de brusquidão sobre  a água sem sonhos do mundo que se escreve a gelo a sangue a medo e  nesga de lâmina Rasgar uma realidade obesa de abraços artificiais é fácil como escrever uma pedra com música

O QUE SEI, SENHORA

O que sei, senhora, é tão pouco diante dos sentidos inexatos. O que não sei, senhora minha, urge em teu modo fátuo, que se ancora presto preso onde me planto, pássaro afogado em vôo lesto. O que sei, senhora, bem se esgota diante de teu vulto vasto. O que não sei, senhora, é farto ao cerne pio, pleno de mistério, triangular meu céu: teu monte em pernas. O que sei, senhora de perceptos, diante do que sinto, é herdado dos amantes poetas medievos, santos jogralescos, sós herdeiros de indecentes tortos cavaleiros que por ti nos versos se endireitam. O que sei, senhora, se alvoroça no fogo do perfil com que me impedes o ancho coração e o atropelas com teu rosto em pedaços que se evade, oceano a me dar bravas procelas, a me afogar, enquanto há sol nas árvores.

TORTOS CORPOS

A noite está tonta e nua. Tonta e nua esta a noite. Vazios trincam meus sonhos. Já vazios tão trincados. Quelóides de ontens na alma. São corpos tortos na noite. A noite cai. Seus deltóides Tensionam escuridões.