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Mostrando postagens de novembro, 2014

CHORÃO DE RESSACA

Eis que vomito no rio do seu pescoço com anseios verdes depois de você me deixar falando com as moscas que aliás são muitas na sua casa porca agora quando tenho ódio ao vento pleno de polens a direcionar a alma dos galhos e vou matá-la amanhã com o amor de ontem hoje fico intacto

DUAS EM UMA COMO SE FUNDIDAS

Procurei por todo lugar, embaixo da cama, nos escaninhos do computador, nas gavetas, às quais tive de consertar, com um preguinho nos cantos, procurei no corredor, debaixo da pia, onde encontrei uma gota gelada, solitária, e, em ato de misericórdia, a matei com um paninho, procurei na televisão, no sofá, detrás das duas máscaras venezianas, que trazem cada uma um espírito, e não encontrei, até que indaguei da esposa, que jogava cartas virtuais, sobre a minha alma, e ela me respondeu que estava junto da dela desde que nos casamos naquela longínqua noite e de tão agarradinhas é como se minha alma não existisse, fora da dela a foder a minha com gozo de deuses com satiríase

MITO DE CARNAVAL

Nas memórias da infância o carnaval tinha cabeções e fogos até na ala das baianas. A morte por vezes aparecia nos carnavais antigos, mas a morte que se lançava em cada um vinha ao ritmo da bateria das tempestades em compasso-paixão de trovões. Os orixás não tinham medo de encarnar e de ficar com as ninfas-destaque. Ele na época era bom em reter os nomes. Ele na época era bom no trançar palavras. Conseguia rasgar sem retalhar os anos febris e esperançosos. Sabia vestir roupa de pássaro, de sapo, de raposa, de leão, de lobo, e, sem medo, devorava o sambódromo,  como um animal, a seguir os rebolados das árvores, quadris em caracóis. Mas, agora, ele era um mito, uma crença escorrendo no tempo e não adiantava juntar seus visgos.

A MOSCA FORA

Num pote de vidro por três períodos a debater-se  o ser incerto  se encolheu insetamente "Nosso amor-próprio  parece exaltar-se  com a censura que fazemos,  e humilhar-se com o louvor que damos" Se debateu o ser em certo sentido além do que se viu aberta a compreensão a frases e fases que não eram suas O próprio umbigo - ídolo eterno  dos literatos que ajoelham errado A mosca enlouqueceu  se debatendo no pote e o pote se abriu,  foi então que renasceu  no amor da cozinha,  onde um perfume de bananas tomava a mesa

A MENINA DE DREAD

O ventilador o olhar o som invólucro coral de poeira cupins deixam asas na madeira na cadeira uma marca no copo um compasso um celular o óbito da noite o bote do vereador que não dorme e desespera por uma vaga pra correligionária no sofá o suicida perto da ponte olha pros lados antes de pular por alguém que o empurre na hora certa a maçã que caiu no chão e o amor de duas moscas uma em cima da outra meladas ainda do pudim que a menina de dread fez e de novo o olhar sobre o campo onde agonizam milhares de cupins

ACIMA-DEBAIXO

Acima-debaixo do bicho-papão terror debaixo da cama me disse o avô espanhol o pai pernambucano me falava do papa-figo que traficava órgãos para pagar o aluguel uma prima fazia cortes no braço para se punir pelos desejos pela madeira correntes na memória de ir à igreja e ouvir que padre Igor só gostava auxiliares menor de doze terror acima da cama

O CETICISMO DE LOUÇA

O ceticismo, patrocinadores danados e bons dão óbolo para a festa pública,  pagando as roupas e o varal, o cansaço, as louças para a pia da cozinha, meu verbo é vírgula, e o texto fica seco quando lembro de um golpe sujo contra um homem-barata, o juiz não fez a contagem e quase deu nocaute, onde uma brecha de desumanidade se mostra, quem cobra? quem cobra  onde há ser humano nesse mundo que dê uma alface  para um prato que grite ao rosto? estou só  porque o saco irremediavelmente está cheio sob o juízo do outro, o outro que se acha mouro, ninguém se multiplica como acha, dividimo-nos, de mãos curvando as folhas, ante o lucro das botinas do palácio

NO AQUERONTE

Em Gaza sinalizadores de morte. Crianças paradas no ar pela ilha de edição. Avós estranguladas pelos canos dos canhões. As estátuas feitas de balas com amor. As pupilas montam o cavalo chamado Indiferença. Um ministro mata crianças perfiladas como em boliche. E próximo um pelo voa de uma cadela manca. Todos passarão pelas raízes de óbolos.

VIZINHANÇA ENQUANTO A NOITE DESCE

O vizinho de trás ajeita o microfone e canta, sem ter nada disso, ajeitando-se no invisível. À frente, Guimarães Rosa, reencarnado numa roseira, ali descansa um gato. Acima, uma mulher enche bacias e as joga nas cabeças dos pardais. Na frente, roubam, roubam, e não devolvem. Inclusive o dono Do quiosque. A noite está descendo E esquecerei a todos, quando ela retornar Da cantina.

HYDES QUE SOMOS

Depois de ler sobre Kafka Em interior batalha, Na urbana guerra dos tronos Vou, com medo e sem muralha. Não sou de raça escolhida, Sem grana pra smartphone. Meu talento : na axila Meto a mão e sai trombone. Na rua, este templo urbano, Que nos perde e condiciona, Somos baratas expostas. Suas pedras como espelho, Atadas por densos frios Mostram os Hydes que somos.