Pular para o conteúdo principal

Postagens

Mostrando postagens de julho, 2013

POLIR O CAIXÃO

Este é o fim, caro sonho. O fim. Caminham as lágrimas doentes. Pelo vale da carne. O elo nos confunde. Mas se você for devagar, Quem notará o som Do corpo em meio às asas? Eles sabem de tudo. Eles sabem de tudo. Se você for pela estrada, Devagarinho, Ninguém notará. Mostra um sorriso Para que pensem no crânio ridente que guardas embaixo do rosto. Todos sabem. Todos sabem. Terapia, dizem os sábios Entupidos de Lexotan E de deuses de cabeça branca. De um lado de sua narina, Um fluxo. Esconda este fluxo de desamor No coração rachando. Vá no banheiro. Mais uma carreira. Vomitas a mágoa do começo. Te telefonam. Atenda e diga: Estou aqui com meus amigos. Já estou indo. Estou descendo. Mas tenha o cuidado de polir o caixão do desamor. A morte não quer responsabilidade. Era pra ser leve e polido. Como fosse um cinto para a formação. Meu amigo, o tempo está de musgo. É o fim.

RETIRA-TE

Retira-te com cuidado pra não ferir o cãozinho morto em seus ombros Joga-te no pé de feijão enquanto cresce para as nuvens e joga-te no abismo ponta cabeça xingando velhos ícaros verbais Há palavras estendidas que o aparam? O que é o hoje? Miséria com polegar? O que faz o pare-Ser, cãozinho morto em seus ombros? Teu sonho entrelaça passarinhos mortos

MAÇÃ

Há uma ontologia nesta maçã que como e o poema ganha uma forma definitiva. Mas ainda sou culpado por esta casca.

TELHAS DE EMOÇÃO

Outra vez, saio daqui. Só. Rascunho imprópria mitologia. Um gato quase fala no teto. Uma emoção entre as telhas. Que sei da dor? Ela se sabe. E caminha entre nós, curvas Costas, olhos turvos, muda E calada num falso carro, Cujas rodas estão com varíola. A pele vai rasgando, a alma Com um zíper, sobrevive às telhas. Um canto sempre espera por nós Depois de nos explorarmos bem. A canção é o ser quando o ser é voz.

NA TOCA

Na toca, rege a impossibilidade. O canto do sol para as faces do escuro. Você sabe, amigo Léo, do vento norte? Um amigo está sempre dentro do café no bar.

APODRECENDO

Neste fogão apagado há um modo aceso. Teu corpo estendido no molho. Tua boca com dentes roubados. A face que floresces me apodrece. Resta o lençol com musgo intacto.

LIQUIDEZ

O desespero de criar vai explodir num trem furado de verniz. O sangue será limpo rapidamente pelo esquecimento. Os miolos serão dos trilhos. A alma esmiuçará o ferro da memória. Quem te ama mesmo? O beijo? Muitas garrafas e panelas dizem que tudo é líquido.

ELES OS GORILAS SOBREVIVERAM

Eles sobreviveram, guardaram como recordação as tenazes para dedos, ocultaram em cima do guarda-roupa a guilhotina portátil, a forca automática, a metralhadora oculta num disfarçado guarda-chuva-e-sol. Saem de manhã como o cachorrinho azul, depois, à tarde, voltam para suas casas, beijam faces familiares, tomam café com pão-de-queijo, talvez, ou tomem os netinhos no colo, emocionados com as possibilidades de seus futuros, querendo viver mais uns doze anos para vê-los cursando Direito ou Medicina ou Odontologia ou comendo rabos de saia debaixo de pontes e edredons sob os olhares de seus Capitães-do-Mato. Como são belos esses velhinhos com caras de céu e corpos de jardim de plástico! Como são frágeis seus passos sem culpa! Como são saúdaveis com suas refeições de horas certas! Estão uns anos a mais, quase morrendo, e esperam mais doze, em Deus pela Pátria e Liberdade, devorando muito ferro e zinco da Nova Culinária. Vez em quando, um desses velhos apanha uma cadeira daquelas bem s

NÃO POSSO SALVAR O DIA

Não posso salvar o dia. Ele já nasceu crucificado. Não posso salvá-lo. Seu sangue sobre nós. Até queria. Mas está escrito nas peles como estigma. Bem no centro dos seres. Doendo como um osso gritante. Escangalho suas costas. Acendo com meu escárnio seu caule. Mordo suas folhas com meu cinismo. Não posso, não quero, queria.

O TEMPO É TEU?

Pode pisar, o tempo é teu, Não esqueças que embaixo, Embora o espaço/tempo dobre E nos confronte, Senhora, Faço palavras-circunferência. Quando estiveres sem ar em cima Não esqueças a força que de teus olhos Senhora Pus ao canto dos meus óculos como estepe E só há sofrimento no poema Quando ele se joga.

O FATO SUPREMO

Veio. O fogo perto ainda. A dor de suas mãos Caía em lindas chuvas, E todos lhe liam O desejo, fé, mergulhos Com a beleza de suas vinhas. Veio. Para os fatos, era O Fato. Sob a marquise, na moitinha, O cheiro da Suma Chuva, Longe do inquieto anseio, Parecia... Deus no espelho. A verdade é que ele veio a essa cidade velha. Quem era? O estrago Que me espelha, Escuro lago, seco Seio.

AMORÁVEL POETA SAIDO

O poeta saiu do centro: dura figura. Saiu do cerne, esquecido  e cruzou por fora. E lhe dariam um cargo  em comissão no Inferno  por ingênuos sonhos parricidas. Mas esses sonhos  há muito alimentavam  corvos de ironia... Assim: Voltou ao início das coisas.  Flexível.  Amoleceu, amorável.

FORÇANDO EM TEU RIO MEU FLUXO

Fui sonhando os peixes que pescava No oceano em cheiros que sentia Fui sonhando os peixes que comia Nas panelas com que o ser cozia Fui sonhando as espinhas esguias Que ao meu olhar engasgavam Fui entretecendo guelras Que em meu mar ressonavam Fui ficando um dique profundo Onde um pesadelo emudecia E forçando em ti meu fluxo Onde meiga morte seduzia, Reabilitei-me, chuvoso

NÃO TE FIES

Não te fies.  Escrever é difícil. Fácil é a máscara. Está torto por dentro. Não te aproximes.  Não faças barulho.  Só por fora ele é reto. Está muito diferente.  Não tem previsibilidade. Olha os tubos curvos  em seu verbo áspero. Mordeu-se a invertebrada alma . O verbo reflete.

ABISMO

Elas dançam Nas pedras do abismo. Elas dançam, Nossas vítimas. O palco Nós, onde pontificam, Já lhes provoca cansaço? Não, elas rezam a deuses-pais nossos. Nos perdoaram. Elas, as herdeiras de nossos ossos. Sem elas,  como aplicar nosso sadismo?

SONHO E ÓCIO

Quero tirar-te Dos meus ouv idos. Por isso o poema Que ouço agora É de uma voz inexistente, Destemido embora. Há poucos dentes Em meu juízo? É que o poema Em meus ouvidos É surdo e antigo, E os seus versos Vão repetindo Tuas mordidas. Quero tirar-te Destas retinas. Por isso o mundo que vejo e piso É de um poema a se rever, Cegado antes Aos sóis intensos De intenso fogo. Banhar-me em rubro Sem muita dança: Assim, esqueço Lembrança indócil. Imaginária? Quase não posso Viver e o poema que deixo aqui Adoentado de sonho e ócio Semelha o corvo De "Nunca Mais".

VENTO SEM AR

Sem preparadas imagens, O belo é neutro nesta estrada, Não sei se é feia nem bonita A cara do poema-espada. Uma massa bem calada, Um gosto de aço e sangue, Uma forma arredondada De lâmina exangue. Embora não saiba a gente sonsa e Salsa, são produtos sem mercado Os mais-mais. Sonso soul. Como um traço feito há pouco, Aqui, o Belo surge feito terra  Emocionada no vento quente.

ORVALHO AO LUAR

Pintei a imagem da tuas crateras, ser a panela no espaço da tua cozinha bamba, ser a colher torta e oca indo à tua boca morta, as fezes da tua mágoa, a lança de teu soldado no ventre de teu dragão, a urina de tua chuva, o fedor de teu trovão, a sombra de teu élan, o cheiro de teu pescoço, a chave com que me abres, a fumaça de teu cérebro, o perfume de tua palavra, as marcas de teus vermelhos, o mofo de teu vestido, que cobre, mas mostra tudo, a bagunça da tua cama, a ordem de teus arquivos, as letras de teus gargalhos na internet - kkk ou rsrs, o amarelo de tua ira. Deixa-te morrer pra eu ser a terra em teus cabelos, ou a própria manhã em suor a renascer de tua gaveta, o etéreo mito onde se casam Morte e Amor no Passado. Sei de mares infernais que perderam sua coragem por não mirá-los tuas vistas, sei de orixás marinhos que morreram afogados num remoinho a teus pés, de deusas que feneceram por te perderem o padrão. Sei de navios que naufragaram por piscares, Lua. Sei de mundos que for

COSTURANDO A ALMA

O único jeito de dormir É deixar os vulcões dos olhos Molhando a boca do ar na noite E sua alma sem pele Depois esmerilhar na lua O sonho infantil de pegar moscas Para a carruagem em conchas Do mar azul

TIRANDO O RESSECADO TEMPO

Enquanto aos pés do eu a vida colhia seus olés, o súbito contentamento de estar na pele das coisas abria a flor perene. Folhas começaram a cair das estrelas próximas, folhas verde-metálicas mascadas por lábios de nuvens, abraços de sorvetes de mercúrio e sonhos de circos alados, e andavas de luz em luz, bem devagar,  enquanto o eu tirava o ressecado tempo no sangue da noite.

DE DENTRO DO MEDO

Desde o primeiro vagido O medo Desde o primeiro medo A submissão Desde a primeira hesitação Fortaleceu-se O mito do medo E seu deus O filho à morte Desde o primeiro arremedo De choro Desde as primeiras estrelas Desde a primeira clava Que atingiu a partir do medo Mais de dez mil cidades Do primeiro afeto Desde cedo A cidade de dentro Do medo de amar Pegava fogo

MULHER É MAIS DO QUE FLOR

1. Rosa, imersa n'espinhos, Perfumes tantos aflora. Mulher num mar de carinhos, Estrela estendendo auroras. 2. Hortência, alegria colhida, Estilhaço em luz, gozo é vê-la. Alegria em céu de partida, Mulher grávida de estrelas. 3. Tulipa, molhando os cabelos Com elegãncias azuis, Pingo a dançar com anelos De amor, no fulgor da luz. 4. Margarida, flor perene, Fácil, de bom cultivar. Sob um palco, a mulher treme, Bem nos quer por bem se amar. 5. Dália, marulhando o ser, Flertando com o sol perfeito. Mulher a se desprender, A espetalar preconceitos. 6. Em suma, flores vitais A florir tempo infinito. Mas mulher é mais que flor, Doendo amor em cada mito.

TEMPO CURTO

....Eu só tenho a poesia. Não sou tão belo como soía. Trago algumas queimaduras Que são tão feias Quanto as tuas. Como ser poeta sem ter carne viva Para o beliscão das coisas sensíveis? Não sou tão belo quanto aos 20. Sou mais frustrado que aos 30. Com menos saco que aos 40. E tou na área aos 50. Eu só tenho a poesia. E muita gente na cozinha Querendo me ajudar No devorar dissimulado. Como ser feliz sem ter o alimento Para o tato acre da sede viva da morte? Pode a morte surgir de súbito, Pronta, num breve assédio. O tempo é curto pra piscar. - A morte tá indo ali! Mate-a! Peguei! - Enganei a Sombra na casaca do ovo! (Era o Triunfo, aos ombros do Tempo.)

FALEI A VOCÊ

Ah, falei a você da raspadinha? Feita com raspa de segundos. Lhe falei da aposta? E que esta noite tá besta. Me doem as costas. E que o coração é o leme. Da alma em mares tortos. E que o corpo salga o espelho.

SAUDADES

Saudades. Gorjeios. O cheio ser venta árvores que cantam folhas. Por outro lado, venta chuvas na goela da vida. Penas das asas na goela fremente da alma engasgada.

SEU ESPELHO CANTAVA

Atirou-se na banheira, sua pele ganhando a consistência líquida da água. Seus órgãos ficando azuis como sonhos de pureza. Ao sul, um pássaro com bico de nuvem. Ao norte, um canto de andorinha parando o tempo. Quando ressurgiu na banheira, seu espelho cantava.

CORES DO NINHO

Ela tem as cores nos braços, as costas curvam amarelos de lua e sol, e ele a adora com a alma branca e rubra. Em seus sonhos, ele busca o ninho dela e faz uma festa iluminada de arco-íris a que ela ria e dance, chocando os ovos. Ele fica feliz só de não existir ali, disfarçado numa janela aberta para o mar, espaço onde seu céu nada todos os sonhos.

BRINCANDO BRINCANDO SÉRIO FICANDO

Tudo uma brincadeira. Pulamos corda. Brincamos de pique-esconde. Libertamos passarinhos. Libertamos animais de suas jaulas. Cavalos de suas selas. Cães de suas coleiras. Portas de suas chaves. Quando percebi, eu não brincava. Eu levava a sério. Foi quando te assustaste. E me deixaste aqui fora. Te peço: Traz um poemagarro pra mim. Deixa embaixo da porta.

AS NUVENS MORREM NO ARCO-ÍRIS

Acenam frágeis as nuvens. O que as faz cintilar? Fico a mirá-las em sua ânsia Na rua da poesia desprezada. E o Sol que passa e não se interessa? Sempre a chover suor nas testas. Pergunta a Terra: - Não liga às nuvens? O sol não responde. Talvez esteja velho. O dia a passar, há assaduras na pressa. As nuvens se matam, chovendo. O sol nem aí.

EM CARNE VIVA

Foi assim. Ele amou. Comecemos sem delongas. Ele amou com os dentes. Bem depois notou O amor sem pele. Todo em carne viva. Doía no encostar. Mas era essa pele um órgão vital segundo os melhores livros. Sem espessura cutânea, não ocorre a regulação térmica. Nem o controle do fluxo sanguíneo. Não fede nem cheira. Não começa nem acaba. Mas é tão intenso quanto qualquer amor com. Talvez até mais, há ouro nas suas células epiteliais. Foi assim, ele amou com prazer e dor. E esqueceu do amor que sofria em carne viva. Porque era burro como uma porta. Sem pele o sentido de sua vida.

UMA MÃE COM FILHOS ENTALADOS NA MEMÓRIA

Ícaro, não. Mas Dédalo sabia. Porém, como bloquear o desejo do alto? Também fora jovem. Experimentara o medo das distâncias. Tantas vezes voltara com a pele na cera derretida. O coração acelerava, e ria muito, bem largo. O prazer de ter enfrentado os dentes da morte. O riso de ter desnudado as nuvens distraídas. Por isso, deixou Ícaro ousar no colo do sol. Dédalo sabia o valor de avançar no risco. Quando viu o filho cair feito um facho, seguiu-o. Duas estrelas cadentes atingindo o barro. Dédalo queria ter morrido. Qual uma mãe de filhos enganchados na memória.

TUAS PESTANAS

Tuas pestanas acenderam as centelhas do universo. A gravidade da lua tua causa as marés no peito. Tua gravidade nua  sobre meus mares enjoados. Dos antigos nautas,  trago apenas estes ombros  a que descanses  teu cheiro de árvore  nos olhos do meu acalanto .

METAMORFOSE

Pedras amontoadas. Há medo na calçada. Cães, ratos e pombas. Um papel resta amassado. Minhas patas grudam. Um verso morto no focinho. A lua arde como o sol. Meus pelos anoitecem Para sua nudez.

FLUÊNCIA QUE EMUDECE

Israel olhou uma mulher. Ambrosina olhou um homem. Aí então começou uma história. Um olhar assim rende livros. E lota estrelas. Pouco se fala sobre esse olhar. Meu mundo girou por causa dele. Por isso, a explosão nas retinas E o calor que trago do útero dela. Duas almas em mitologia Sempre explodem razões Para a fluência dos corpos Emudecendo até a escuridão.

A MORTE SE CANSA E DANÇA

A casa está quieta. Embora o claro mito. Há uma sonolência. Há um tom em raro teto. A morte com asas de maia. Meu pai só queria oito. Me dizia enquanto em choque: Só oito anos, fuck you. Meu olhar rompe a escuridão. Desenrola a pele das paredes. Poemas xingam com feridas. A morte dança sobre o fêmur.

ESQUECER CASCO DE VIDRO

Esquecer o casco frágil De meu barco de vidro Esquecer que o não-colhido Deu desejo em mais-valia Num traço incompleto Que ardia além do verso E da vida Esquecer o beijo não dado Na pintura nova da janela As ausentes piscadelas Os pés invisíveis do abraço Deslembrar o canto e as velas Reestudar o caminho, assim, Escancarado, retinas inchadas De um ser não concluido Debaixo de escada inexistida

AGRADECIMENTO

Uma mão veio. Cortou a face do gelo. Então, por sobre a luz Da mão que libertou-me Voei como um jesus Mil acrobacias de agradecer O ar, o seu tempo, fiz Com vida quente a moer.

SIMPLESMENTE A LUZ E A SOMBRA

O amor deitava no atrito entre nós, Havia volúpia nas nossas veias Onde velhos vinhos temperavam-se. E veio o beijo, Havia uvas gregas nos seios dos lábios E ondas banhavam-nos No oceano onde luas rascunhavam Eternidades que desejos traziam. Não fazias promessas nem mágicas. Eras simplesmente a luz e a sombra.

O EFÊMERO ARRASTANDO FEITO TOALHA

Os lábios no efêmero da vida. Congestionamentos imitam dominós. Uma sopa urbana por apurar o tempero. Eis o dia e sua toalha arrastando. Há o amor no centro de tudo. E só ele cruza a pele na alma. Como a daquela mãe na África esquálida Dando pro seu filho cuspe como papa.

VOCÊ TEM SABE AQUELA COISA

Você tem sabe aquela coisa Não sei se entende se me escuta Aquele charme e jeito sonsos Como filme oblongo e curto Que nada sendo é tudo e pende Que sentir basta soando sons Sensuais de "ends" que represam O amor em preto, cinza, e branco Se soubesse mais Não sei se entende O que sinto é isso: som sem prelo Por amar assim meio sem elo Pois inda não sei e se soubesse Como aquele filme em foscos sons Que sentir bastou soando franco Represando curto grosso e troncho Sabe aquela coisa se me escuta Você tem um cheiro que avulta Abrindo as virilhas das panelas Para aquela coisa em noite hirsuta Que você abre, monta e sela

PEITOS NAS SISTEM/PESTADES

Mercútio, irmão meu, deitado na chuva em cima dos cacos do palco indiviso, teu bafo contamina os bem-nascidos nesta urbe pudica que nos vampiriza. Grande ator, irmão meu, como era bom botar bombas no cu de Satanás, o Status Quo, até irmos ao colo das deusas contaminadas com o vírus do teatro. Teobaldo, irmão meu, como era gostoso pichar as peles das palavras com ousadias, encantos mágicos, a poder de mantras, necessários à nossa escalada no ser do fogo. Hábil ator, lembras de Prometeu? De quando roubamos seu fígado aos urubus que devoraram a águia de Zeus? E a maneira febril com que o comemos? Julieta, irmã minha, hoje Já não há estudo, ninguém quer mais procurar o segredo do aço da espada da alma em flor. Atores e atrizes eternefêmeras, os carros passam a toda velocidade, e tuas almas assumidas pela platéia são puro carpete para convenções agora. In(fame) irmão meu, lembra daquele velho que pintamos de prata, de nome Shakespeare? Digo-te qu'el

INTEIREZA FENDIDA

Deram-lhe escamas de peixe-poeta aos tantos anos.  Disseram-lhe: vai por aqui. Avançou em mares e rios. Veio a centésima corrente de amor. Foi quando sentiu as garras do fundo. Começou então a história de sua morte pequena.

POR TODA A ETERNIDADE DO AMOR

Tonia Carrero curtiu o status de Vânia Sombrero. Ou curtiu a foto dos Maneros. Sarah Montenegro curtiu a publicação de V no mural de T. E comentou a própria foto: "A tá rsrsrsrsrsrs bjus". Ribeiro Rabelo Rabo adicionou uma nova foto de quando tinha seis anos e cabelo. Fernando Paulo disse, cantando: "não olhe pra trás apenas começamos" e aqui vi um sentimento e uma esperança cobrindo o amor com asas e água de limpidez inaudita.

VALIDADE DE UM AMOR INFINITO

Como eu estar bem Se sou o que vai E que pouco vem E que pouco sai? Como estar bem Sem ter lisa pele Ou sem ver-me os olhos No espelho em febre? Como estar bem Sem saber-me a engano Com dedos em transe Na morte do sonho? Como eu estar bem Depois do escuro Que me presenteei Escrevendo duro? Como eu estar bem Sem ficar ansiando Por ter-me outro dia Na noite inventando? Como eu estar bem? Me diz se há sentido Se o que me valida É o escrever infindo?

AMOR COM GLAUCOMA

Desculpem se não sei amar sem constranger. Se não sei ocultar o esquilo de dentro. Se todos sabem do meu amor com glaucoma. Se quero espalhar pra todos o som das horas azuis. Se meu amor é uma cadela que se solta. Se sou criança que pendura o ato de amar No rabo do gato. Se quem amo está no útero de uma gaiola. Vejo-a dançando com as árvores. A Lua no centro da andorinha anoitece meus olhos. Um pedaço de asteróide lança-me chamas em desafio. Incinerado sou então por ter música distraída. Vidrado sou no modo dela girar o pescoço. Bêbado de galáxias, tropeço em letras invisíveis. Doaria da minha cabeça liso espelho para cometas calvos. Agora, vejo-a dançando no pescoço do tempo Linda como a canção nos lábios do passarinho Cujos olhos morrem enquanto a alma ensolara. Desculpem se o salto que dou faz todos tremerem. Se não sou belo como o som da noite arrotando.

LÍQUIDOS GOZOSOS

No desejo as fendas onde ficam asas a vivificar a púbica casa E em meio aos meios nos vales dos corpos deixar os receios e pensares mortos A língua da amada relambendo a janta a molhar a puta fúria na garganta Ele cutucando o grilo gritando, ambos se enredando na mata matando É como se geram líquidos gozosos: nos mais internos mares cavernosos

GORILAS FANHOS

Como se o passado Fosse um mudo fanho, O tempo nos segue Limpo após o banho. Foi-se a ditadura Rumo ao beleléu? Não, vive na esquina Com seu rabo em mel. Mil traíras vertem Bigs nas cuecas, Fazem novos ternos Com sangue e melecas. São os bons gorilas De um tempo revel, Fel em fotoshop, Se bobeamos, créu!

VIDA ÁVIDA

Tudo pelo som da cor dos olhos. Eu me doei. Doido. De pedra. Vieste. Doída. De perdas. Eu me dei. Sem volta. Cedo? Em ti dói. A ida. A volta. Não teres te doado Foi poda gratuita ou medo? Eu doendo, doído, um tempo. Dúvida. Tu, doida, endoidecendo. Ávida. Mas de tudo o som, ah, o som salva!

A VIDA ANDA

Feliz, fora, O corpo trinca, E, cacos dentro, A alma vinca. A garganta Atrita Com batatas Fritas. Um poeta é soterrado pelo poema derradeiro. Embora trema A fila bamba, E a morte gema, A vida anda.

MAÇÃS DO AMOR GRUDADAS

As maçãs do amor grudadas. Grudadas, entende? As folhas, pubescentes, abaixo das flores. Não podemos dizer que havia algo mais real. Ao subir na árvore, sentimos o tronco escorregadio. O dia perdia um pouco da inflorescência da aurora súbita. Os frutos eram movimentados pelo vento oeste. O pensamentos pelo vento do inverno e o corpo, de sementes, se espalhava como sempre. Ao sabor da surpresa das coisas. A morte sempre foi um óbice ao eu incompleto. Por mais que subíssemos, jamais chegamos ao topo da árvore, onde galhos imitavam multidões aglomeradas. Por sua grande variedade de espécies, as maçãs do amor jaziam grudadas.  Jamais desgrudaremos?

AOS DELICADOS BATIDOS NAS LÂMPADAS

Quando gritaram,  incandescentes, fomos chamuscados. Tornaram-se nosso espelho enquanto o sangue escorria, antes e depois. Negamos. Quantas lâmpadas nos rostos para iluminarmos nossa falta de sentido? E quando nós mostramos sinais de nossa monstruosidade atávica, garatujas de ódio inconsciente, nos braços por mães sombrias com ramos eretos de um falso pai às mãos, proibidos ficamos de soletrar: ho-mos-se-xu-ais... Herdamos terra para soterrá-los. O denso sangue coalhou a calçada fluindo em fragmentos de lâmpada. E clamamos ao alto nossa justiça. Amanhã, restará a paz fornicando com remorsos. Uma lâmpada acende quando outra se quebra? Quem quer acender comigo? Por vezes, é preciso acender a lanterna. Odiamos o que amamos? Quando aprendi o verbo foder com o verbo gorjear por dentro aprendi a soletrar o rosto justo das coisas.

VOZ DE JUJUBA E BALA

Vem ritmos do chão oculto, como se O cheiro da infância estabelecesse O ar, vinculando, Qual flog londrino, O andar neste chão urbano. Ouço as vozes que me falam do jardim. Vozes que me pedem, que me afugentam De afetos que perderam medidas, De gestos no ar parados. Assassino, Movimento as mãos, apunhalo palavras, Entrelinho então sangue em papéis. E é como se rezassem ao istmo da Infância Naus líquidas com voz de jujuba e bala.

VENTILADOWN

Ventilador. O som. Atenção. O dia aquieta aos poucos pés e mãos. Há profundidades que só descobrirei ao final da noite. Espero antes ver o luar.  Espero apreender mais uma vez o luar. Uma máquina fotográfica.  Um carregador. O ventila- dor. Espero ver o luar. E aprendê-lo. E apreendê-lo. Prendê-lo à fala. Carnavalizá-lo. Comer o luar. Como BIS. Nas pedras pintá-lo. Ninguém pinta como eu Pinto. Mas por ora O som do vento. Digo: Atenção! O tempo! O dia se vai e a noite vem. Há profundidades que só as rugas têm. Aos olhos: uma máquina fotográfica, um carregador, Um cigarro. Um retrato. Varre-me O ventila- DOWN.

ENCERRADO

Encerrado: em seu dedo médio,  o sangue, em bis, em pus os pés. Encerrado: em seu dado mádido a folha, o orvalho, o tronco, a fé. Encerrado: em seu pátio o peito em bolhas, talho a telha em dez.

NÃO SEI DAS MUITAS FALAS

Não sei das muitas falas, sei dos muitos silêncios ante metas altas e caminhos densos. O silêncio ante as ruínas da voz que existiu, mesmo em seu canto no sonho que seguiu. Não sei das muitas balas no ombro, peito e ventre. Sei do revólver alçado no gesto fóbico.

LÁ VEM O CARRO DE CHURROS

Lá vem o carro de churros de leite e de chocolate! De tanto correr atrás quase que a magrela bate. Lá vem o carro de churros de chocolate e de leite! Maria pequenininha arregala, dando aceite. Lá vem o carro de churros de leite e de chocolate! O cachorro corre atrás, mas o gato lhe combate. Lá vem o carro de churros de chocolate e de leite! A portuguesa nem olha, prefere pão com azeite. Lá vem o carro de churros de leite e de chocolate! Rô escolheu Julieta e na morte deu empate. Lá vem o carro de churros de chocolate e de leite! Mato o tempo. Só me prende o poema, por deleite.

PASTELEIRA

Quero dessa pasteleira os seios de camarão. Depois, quero ser mosquinha entre os meios de teus vãos. Quero um pastel, pasteleira, de carne de boi pego a laço. Depois, quero-te faceira e nuazinha num abraço. Quero um pastel, pasteleira, regado a catupiry. Depois, quero na soleira um naco salso de ti.

GRAFITEIRO

O grafiteiro grafita o muro da prefeitura. O poder sai nu na rua, de cuecas, furibundo. O grafiteiro grafita o prédio de madrugada. Vê a modelo dormindo e desaba da escada. O grafiteiro é tão bom que até passa o grafite no narigão do bom Deus, que, de rir, chove do chiste.

APAGÃO

O apagão apontou, A casa se encolheu. Será que sou quem restou? Ou quem desapareceu? Tudo se tornou um breu, Sombras suando nos vãos. Incendiados com velas, Anjos rolam pelo chão. Acendi o meu escuro, Luzes fiz de escuridão. O amor ferindo o eu, Arpoado tubarão.

PAPAGAIO

O papagaio vizinho Fala mais que Dona Cota. Vive imitando os galinhos, Vive fazendo chacotas. Se eu chego, diz: careca! Quase depeno esse corvo! Ê papagaio metido! Êta bicho bem danoso! Quando vê alguém chegando, Diz suas picantes frases. Só mesmo o bico amarrando Dele, faremos as pazes.

AQUÁRIO

Meus peixinhos de aquário São atletas engordados, Ultrapassando limites Em espaço limitado. Um dia, joguei mosquinhas Para a fome eles matarem, E os peixes ensinaram Todas elas a nadar. Adoráveis gorduchinhos, Parecem bolas nadando. Na redoma do aquário Peixes-elvis rebolhando.

TITIA CABRIOLANDO

Tenho uma tia beata, Raro sai pra outro canto, Vive entre muriçocas, Besouros e pirilampos. Sua casa tem telhado Feito de doce de manga, Paredes dão chocolate E torneiras dão miçangas. Sua vassoura tem nome - Rapulóide Rapunzel. Titia só sai de casa Pra cabriolar no céu.

BELA VIOLA

O Gordo é um gênio Em computador. Leva mesmo baque Se o assunto é amor. Chega a ter tremores Quando vê Maria Passando na rua, Ao final do dia. Mas é no teclado Que o gordinho vinga, Joga o dedo irado E poemas singra. Se vê um atleta Vem-lhe o pensamento: “Fora, bela viola, Dentro, bolorento.”

NOVA YORK DO PENSAR

A maré tá louca, Beija a areia tonta, Mas nunca chegará A Nova York. A maré tá boba, Beija pó de enganos, Que a areia estende Em seus lábios tenros. A maré é velha De jeito inocente. E eu vejo Nova York No pensamento.

EMPADINHA

Vendendo empadinha, Seu Eládio voa Por tanta ruazinha, Nunca pára à toa. Quando ele aponta E apressado pisa, Nos chegam bem antes Cheirinhos na brisa. Esperto, ele vende, E não faz fiado. Quem prova aprova Bem saboreado.

ZIN, MOSQUITO ZENZEN

Zin zin zin zin! Mosquito Zenzen Ronda nosso ouvido Como fosse cem. Nasceu o mosquito Numa academia, Sob poça d’água Enquanto chovia. Hoje é mestre Zen, Só grita ziai. Quem ele pinica Logo logo cai.  

ESQUINA CORTANTE

Na esquina, Destripados becos, Luas sem cabeça, cães Alertam sobre os pinos De coca e miolos moídos. Em mesas deficientes E sob marquises em fratura exposta Menores com nove milímetros Mascando patas de gato Vontades cortantes Picam rãs em contralto E com papelotes de sombra Os pássaros da náusea Na esquina se arrombam Além da esquina E aquém Nódoas veem Em poças retidas Porém ninguém vê A destroçada vida Por dentro de todos Que dizem "fazer o quê". Implorando A nosso dedo no gatilho As orelhas dos fatos.

O GATO A GATA

O gatinho branco De vermelho olhar, Escolhe, do banco, O melhor calcanhar. A gata amarela De olhos castanhos Lambendo a remela, Nem aí pro banho. O gato catito De olhos pretinhos Adora palito Se tem churrasquinho. Manias felinas: gostam de peixinho, rolar na oficina, e cheirar furinho. Por isso o tapete, com seus buraquinhos, cheira a graxa e peixe... eta fedorzinho !!!