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Mostrando postagens de janeiro, 2013

SENSEI MOSQUITO

Sensei Mosquito Vai pela sala Surfando orelhas Pouco se cala É atrevido Sensei Mosquito Pra ele humanos São pirulitos Suga na veia Lesto e preciso É mestre, creia, Mas sem juízo Uma chinela Balança o rabo Desfere gestos E dá-lhe cabo Sensei Mosquito Vai para o lixo Caixão de luxo Pra inseto e bicho

RELEVANTE CUBATÃO

A minha terra se abraça a rios de relevo interior. A minha terra está presa a conchas de amarelo-ouro. A voz que lhe tange é um cordeiro de sol. Aqui não há moças sem alma de mexerica e ipês roxos. Desde quando nascem, seus risos nos pomares de nossos olhos. Quero estender meu olhar e que achem beija-flores no vento. Que se estampem nuvens retratando ancestrais manuéis. Embora quando esteja triste fique alegre E quando alegre fique triste e vá embora, Há valores doces e cítricos que compensam. E ouço uma música vinda do amor pelos jacatirões. Embora esteja na nove de abril e o barulho seja anti.

VINGANÇA

Fiz pra ti uns contos românticos que leste várias vezes em ensaio. Eram doze contos do instante que faziam-te chorar de felicidade. Fiz pra ti, sem imaginar que mostrarias ao namorado, que eu gostaria de ser; mas se não sou, não sou. Não farei mais contos românticos, encherei de mortes meus escritos, pra que morras asfixiada pelo cheiro de cadáveres.

ESTAR AMANDO E AMAR

Estar amando é chupar uma manga como fosse banquetear-se na casa de seu avô sentado em frente das iguarias espanholas. Estar amando é comer abacaxi como fosse participar de uma festa alemã sentado em frente de dúzias de vestais delirantes. Já amar corresponde ao que nem sei descrever como aquela sereia que ali voa esperando o melhor momento de me caçar.

MUSA FITNESS

Teus femininos dorsais: rochas para se escalar, suprema obra que apraz às loucuras dos pincéis no quadro que o eterno faz. A beleza que cresceu dá astros a quem te mire, e os beija-flores no eu de verde-amarelos mitos faz tua carne hímen n'eu. Digo: quase o coração parou pelos teus costados, foi o neandertal loução que trepou escangalhado de amor com deus às mãos. Que trabalho, pitonisa, apurando-te o meneio, o grande dorsal que alisas...hummmmm! Com beleza bem no meio em céus mil nos localiza! Tuas costas de vestal, tua flor abdominal, teus seios de sonho e sal, teu vulto em circunferências, teus vales de carne e mel. Teus montes de folha e anelos, teus meios de firme oval, teus glúteos de acender o chute no racional jeito de me defender. Ah, a beleza em teus anéis de fêmea no aurorescer, teu corpinho de vestal e eu lambendo-te de cima, vinho e água de graal. De crer muito no que sente, meu egoísmo ritual é o que torna presente o brilho em t

GENEROSAS HARPIAS

As harpias estão felizes. Querem do mundo dentes com fios de frango preto. Suas armas são de ódio e aço ao molho de carbono. -Macarrão cabelo-de-demônio! pedem em uníssono. Um beato previu um jantar à moda sangrenta. No mapa das harpias a Amazônia é de todos. As harpias são generosas e dão hambúrgueres aos povos do quintal.

MORENANDO MORENENTE (reelaborado)

Um dia, em samba de roda, Meu sonho apalavrou. Um pega de pôr palavras No papel, letra fervente, Morena em samba dançava, Morenando, morenente! E nós de carne explodindo: Macacos na roda armada Pela morena - infinito. Mais a morena bulia, E rodava, nossos medos Mil desejos no pavio! O poema - fogo a dançar! A morena, em seus giros, Encostou bem no edredom Que a noite fez, sem pio, E o sol caiu no terreiro Antes do tempo! Já se viu? Cês querendo, até eu fico A noite inteira na dança Se pôr guizo nos quadris Da morena, que, no samba Me guiará o ser gris!

FIM RELANDO

Me espanta o fim das coisas que a TV me entrega sujas, sem cérebro. Acordo e vejo as coisas como são. Sempre o mesmo Cérbero. Os sacos de Caronte fuçados. Sempre no local de lutas Um ou outro amigo aparece. -E o meu processo? Tá no forno? ...Breve vou escrever sapatos E editar chão pisado. - Corno, o que você acha do Poder? -Tem a deformação da forma louca (Embora ache pouca). O cão me segue (cadela?) A velha louca que me pára e pela Com seu ferro quente. -Conheci seu pai, o Alencar. Meu pai era, disse-me ela, De pureza linda e sem-vergonha. Louco sou eu. Ela é laica. Dudu na rua com seu capa preta. Um dia veio um tiro em flor e dor. Sei disso, porque foi ontem o amanhã. Há um canto, enquanto estou riscando. Ela canta e não posso sucumbir ao seu nada. As roupas de Ulisses não me servem. O tempo apequenou. Vejo quatro caras de porco em escândalo. Falam da covardia de Ulisses ao se amarrar. A louca fala que as sereias gostam de gregos. Ela, a louca, s

AGUARDANDO NO ÔNIBUS

No ônibus, muitas aves e animais. Todos aguardam o destino. Também há peixes prateados. Na parte em que ficam há um aquário. O motorista vai devagar pra não quebrar o que seja de vidro. Todos ficam aflitos com o cheiro de peixe. E não veem a hora de chegarem ao final do trajeto. O ônibus ainda passa por florestas, grutas, montanhas, geleiras... Como no trajeto não há rio nem mar, ficam os peixes prateados eternamente no ônibus.

FÓRMULA DE POEMA

Tenho um livro que fala pelos cotovelos e me enche o saco com sua fórmula  de se fazer um poema. Escolher o tema, um. Escolher as lavras. Depois deixar na gaveta. Passar vinte dias. Passar um mês. Se quiser até Passar muito anos. Tenho uma lagarta a atravessar angústias, emoções sem razão e o contrário. Vive a abrir a gaveta  como se abre um forno. Tem cabimento isso? Por isso que eu só leio livros como a uma borboleta que passou no século retrasado, me beijou e abandonou-me.

EXPIRAR INSPIRAR

Abrir a porta. Inspirar. Expirar. Voltar ao sofá. Expirar. Pegar o livro. Nele a tua vida. Não há prefácio. Nem posfácio. Tu terás de fazê-los. Tuas asas estão encolhidas. Apertadas contra o encosto. Penas espalhadas pela casa.

CANALHA CANALHA CANALHA

Farei agora estrofes cheias de fúria, Não como os de Brecht, um luminar Que adorava charutos E bolinava putas de bar Com candura E eu também odeio nazistas; Eles ainda moram aqui, fáusticos, Entre os fodedores institucionais Das gentes Você pode não crer, E merece uns bons tabefes por isso, E para deixar de marcar teus servidores Percebo há muito sua anti-humanidade; Escreverei estrofes anti-canalhas... Quando? Eu não sei, canalha, Depende da raiva que me provocares, Da raiva que instigares Na minha fúria criativa, Que hoje está de quatro diante de mim, Arregaçada como tua criadagem Estudas com suficiente desumanidade Para não atrapalhar o crescimento, E conquistar medalhas e diplomas, Alegrando a canalhice fundamental Logo logo terás um diploma, Correspondente às infinitas maneiras De ludibriar as gentes Canalha! Canalha! Canalha!

VAI CHORAR NOUTRO LUGAR

- Por que o poeta sofre tanto, Por que seu sangue escorre, grosso, E sua pele esconde o osso De sua alma escura e branca, E esta lágrima faz lago, E este sol parece chuva, E este som parece nada, E esta fome e sede e escada, Onde ao subir, subo, caindo, E este passo, voando sobre A Musa Insone, antigo mito Do poeta aborígene. (Ouvindo, o Poema se abriu, Estilhaçando-lhe as origens, De dentro de um corpo vil.)

NA BEIRA DO MEU MITO

Enquanto meu sono faz esteira, eu aqui na beira do meu mito vejo a mulher centauro montada numa tartaruga conclamando a todos para uma ciranda muda enquanto a noite vestida de silêncio faz alongamento sobre o solo de mim tão cheio de areia e pó de arsênico É o modo de eu abrir os olhos fechando-os e fazendo baratas em pedaços falarem com meu sono, enquanto a vassoura não os varre É uma maneira de eu esconder de mim a imensa falta que me cerca e me faz ver os insetos que não conseguiram me pegar apesar das leis do princípio de picar Na esteira um pedaço de jujuba sobrevivente do dente de Sísifo em meu sonho de Ícaro

ENTRANHAS ESPINHOSAS

Centenas de milhares  de ideias sem sapatos nas guerrilhas afegãs. Os conflitos modernos deixam remendos  na justiça afegã. Por vezes dançam os oficiais afegãos  nos ringues, surdos  às fraturas da infância afegã. Tu conheces as entranhas  espinhosas do coração. -Por que a morte assim? Ofegante indaga  a carne-de-canhão afegã.

MORRER DE AÇUCAR

Viu o que fizeste? Sem o teu loló, Agora, ele bebe, Madame Drosó. Não é tua culpa. Nem é dele, certo? Quiseste mudança E ele deu veto. Ficou viciado Em cubos de açúcar, Desde que negaste Chupadas na nuca. Voa em padarias, Mas sem condição, Só pra encher a cara De açúcar-torrão. Bem falo pra ele: Não fique à mercê. Tu é mosco novo, Pega a Mosquioncê. Esquece a Drosó, Mosca afolosada, Que com o Moscão Tá amasiada. "Mosca australiana Essa Mosquioncê. Deve ser metida.. Paga pra você... E me dá um cubo Que quero morrer De comer açucar Enquanto eu viver".

PURA PAIXÃO DO CAMBUCI

É parente da goiaba, Pitanga, jabuticaba, Verde ou verde-amarelada, Carnosa, arredondada, Mole, doce e perfumada, Deixa a língua acidulada, Da família das mirtáceas, Lembra disco-voador Na noite que a lua enlaça. Em Biritiba-Mirim, Mogi das Cruzes, aqui Em Cubatão, logo ali Em Paranapiacaba, Também em Paraibuna, Salesópolis, no Parque Que é palco de neblinas, Na nossa Atlântica Mata, Goza de fama e é fruto De importância regional. Riqueza da culinária, Baga chata e alisada, Com folhas de bordas lisas, Tendo rica floração Chegando agosto e novembro, E em janeiro e fevereiro Dá-se boa ocasião Para colheita supimpa Dessa iguaria selvagem Nomeada por cambuci. Como é gostosa a cachaça Curtida, o iogurte, Os quitutes, Yakissoba, Suco, torta e vitamina, Bolo, bombom e farofa, Estrogonofe, sushi, Carnes, coquetéis e mousse, Sorvetes, geléias, massas, Molho para capeletti, Tudo a cambuci regado. É vário o

O HÁBITO DE HÁBITO

O hábito mordeu-nos o calcanhar. Assim, oprimimos nossos dias. Afogamos nossa humanidade. Esfolamos dignidades, assim. O hábito e suas abluções. O hábito e sua inexpressão. O hábito  desenhado em Lascaux. O hábito desde  séculos. O hábito e sua retorcida boca exógena. Vai pro trabalho, volta aos pés nossos. Conforme de hábito, desbeber a forma.

A JANELA

A janela da verdade muda sempre, a parede gira-gira de tonteira, não fica num só lugar a verdadeira janela que uma posição desmente. A janela da verdade muda a toda hora de lugar, e nos esquece; a gente quer olhá-la, ela nos mente, se a gente não a olha, enlouquece. Por pensar nessa janela que se altera, por nem sequer prever os seus sinais, me veio a palavra de Descartes quando pensou e não parou jamais.

COMO EU NÃO TENHO VERDADE

Como desprezo a fortuna, minha pobreza é que cala. Pois por mais que me aproprie muito mais riqueza instala no que faço ou redefino, tirando ouro das falas. Já acreditei num sonho havido em noite gloriosa, fui escravo, já fui dono, amei a tarde gostosa, amei as manhãs com sono, acordado em minha glosa. Como não tenho fingidas idéias mas as consumo, quem me acredita falseia, quem me ouve, se confunde, quem imita o que desfaço não há cães que o circunde. Já acreditei num sonho...

EXILIO INTERNO

Disse Oscar que se alguém concordar contigo, tu estás no foco errado. Ele é que disse. Não eu. Mas acho. Quieto estou deste lado. Se tu concordas comigo, tem que ser bem concordado, pois sou de mim discordante; durmo de frente, de lado, e quando acordo é distante de onde moro, aproximado. Sou inquieto, confesso, pois tudo já está criado, há estilo colorido, estilo branco, estriado, e não me encaixo tão fácil, tiques eu tenho e não tenho, vidas eu vivo e não vivo, vejo em concreto e abstrato, e se sou caro por dentro por fora sou bem barato. Nasci no pós-fragmento, sendo inteiro-estilhaçado. Meu racional sentimento é de modo emocionado.

EM SUARÃO O VELHO CÃO III

Como o velho cão tá exibido agora! Pra todos late: - Olha a minha pedra! Que lindau! Que redondau! Que branquinhau! (Dizem que os cães negros também preferem as branquelinhas). Pituxa late também, mas com certo ciúme de Max.   Max é agora um cão Sísifo. Cão de Marta e Zé Roberto, condenado a rolar a pedra enquanto viver. Porém, não vê como castigo.   Aceita o destino por sina dos olhos azuis. E sua ternura é um luar sob pelos negros. Por vezes, cansa, pois, é um cão ancião, um sábio cão ancião, com doze anos ou mais,  dizem seus carrapatos ancestrais. E quando cansa gira, como uma máquina pesada, e senta bem devagar,  pois seus ossos doem como amor de mar azul. Pituxa o segue, tremendo todas as patas....

EM SUARÃO O VELHO CÃO II

Contam que Max, um cachorro velho,   queria um pacto com a Noite: ele uivaria e ela lhe presentaria com olhos azuis. O cão tinha tara por olhos azuis. Talvez de tanto ver, sentir, o   mar, ou latir pras estrelas.    A Noite disse: - Não! Basta moveres a pedra! Mas....- Não tem mais! Basta isso! O pacto foi feito com sangue de cão. Então, quando, de noitinha, recebe os olhos de céu, late roucamente,  e move ao centro a pedra  que a Noite sempre esconde dos lados. Pedra que virou cúmplice primeiro, depois, amor,   trocando palavras com ele no morto idioma calhau, língua de pedra,   língua de antes das primeiras mães. Em pouco tempo aprendeu  a esfarelar .

EM SUARÃO O VELHO CÃO I

Muitas folhas secas sob as ondas, espinhos, cacos de dor do mar aberto, e um barulho marinho do começo das eras. O cão velho de orelhas cruzadas  late com os fogos e seus olhos doces sorriem do dever cumprido. A cadela idosa se esconde, pequenina e   rápida, embora a artrite. Fora a primeira a chegar na casa.   Ela seria Xuxa, não se chamasse Pituxa...   

MAGRELINHA

Naquele banco de praça, a magrelinha era uma evidência fóssil. Ela era um dinossauro naquele banco de praça. Entre tantos gêneros e espécies, ela tava lá, insistindo em dar sorrisinhos aos transeuntes. Sua roupa assemelhava escamas. Com menos armadura óssea que o desejável. E angústia. Ficara submersa em poeira muito tempo. Foi quando adquiriu estruturas como chifres ou cristas nos ossos. Está ali, naquele banco, em gesto fixo, corpo teso, de flores seu sorrisinho, a se espalhar no entorno.

INPUT OUTPUT

Esperar em modo de in(segurança) Que audaz pensamento nos recriance. (A moça espera que o chato chegue E a convença ao xamêgo no chat) Ele fingirá de novo. Cazzo. E ficamos a esperar no modo "input" Que aparem as brigas "output". (Em algum espaço uma mulher apedrejada Acordará com terra até o pescoço).

PENA O HOMEM

Sempre quando passo por ali, me fragmento. É que ali um homem pena. Não sei como consegue ser gordo. Há vermes nos outros homens. Ali também há uma TV. Nunca saiu daquele bar. Sei que sempre teve aquela TV. Ultimamente, as imagens das chuvas. Chuvas e sons inaudíveis de dores. O homem que pena também olha a TV.

RETIRO MEU POEMA DO MERCADO

Retiro meu poema do mercado. É sem preço. Seu material é de alma. Noventa por cento sinceramente finjo. Fiquem amigos na praia privada com boas capas e tiragens e palmas e abraços e autosatisfação. Me retiro do caminho desamparado poema póstumo. Com o preço que não me colocaram. Saio para o mar profundo da padaria.

UM HOMEM

Um homem com a mãe no Pronto-Socorro. Não esquece a dignidade precisa. Até enfrenta jalecos possuídos. Vai ao banheiro. Urina arco-íris   E os põe na garganta Para rebentos carentes De alma cinza. 

O QUE FALO

Qual a minha linguagem? Cada um tem a sua? Qual a mais nua? A mais vestida? A mais sígnica? Que mais pinica? Já falei macio. Já mandei às pi... Hoje falo dores. Minha rica linguagem é um pássaro quebrado. Minha linguagem é um mar de pedras. Há flores com vômitos em gel. Minha cabeça gela de nadas em pasta.

É O TAL

Saiu no livro o poema trágico. Olhei-o como se olha um estranho. Tão presunçoso. Canastrão. Não parece ser meu filho. Nasceu tão terno e  Agora está ali estampado. Está tal imagem em simulacro. Esperando elogios absolutos. Esperando as abluções. Não mais nesta alma! Tem agora muitas outras. Despem-no lá fora.  Fazem dele o que querem. De quem o fez falam mal. Do poema não. O poema é o maior. Só por estar no livro. Tem número de página. Tem letra barroca. Parece uma bicha louca. E trágica.

O POEMA DIFÍCIL

O poema não sai. Não quer sair. Tá deprimido. Não quer conversa. O poeta insiste. O poema é sádico. Pisa, morde, empurra. Justo agora isso. Dando de difícil. Se não fosse outrem Com seu deixa disso, Dava-lhe um tabefe Com ponta de lápis E um risco inglês. O poema não sai. Tá se achando inútil. Por que então sair? É melhor ficar Em seu canto fútil. Mas insisto: sai, Seu poema fátuo! A ceitar o fato. O poema não sai. Os amigos fiquem No entanto certos De que sairá. Só agora ele Não quer se mostrar. Aceitar .

CANTO PARA O MOMENTO FERIDO

Canto a urgente pauta, E canto por meu instante, Canto porque é urgente O tempo neste levante. Canto porque se eu não cantar Outrem por mim não garante, E por queixas de mal-amar Faço um bem-amar cantante. Canto pois meu momento Por si só não se alevanta. Então di(verso) arrebento O bronco poema à garganta.   Por cantar como azarão, Azulão com A e R, Se tiver ouvidos bons, E me ouvir cantando, berre.

RISO DE SER DEVIR

Tudo é uma questão de riso. Riso até parar de rir. Rir do amigo, do inimigo, rir da dor e do existir. Se o corpo um riso atrasa, a alma o passa ao sorrir. O que resta é rir de sermos em sorridente embaraço. Tudo é ridente devir, correr sorrindo pro abraço e fazer riso a subir em gargalhadas, descalço.

SACRO LIXO

Antes aquela senhora tinha uma música E quando seus lábios sonorizavam  Os desejos cantavam com olhos de barro Com sua musica, todas as inomináveis Lendas de água e pedras ocultas Abriam passagem entre os mendigos Um dia, por sua música os anjos deslizaram E trocaram as asas por chapéus de esmoler Só pra estarem perto dela em sua casa de papel

PARA SYLVIA PLATH VERSEJANDO TORTAS

Penso na beleza pontiaguda de seu verso. Penso no salto e seu mergulho errado. Penso que ela era de pele tão branquinha E amava com uma alma que vazava. Uma torta que ela versejasse Tivesse talvez um maior sabor Mesmo ao passar do tempo Como sua belagonia única. Penso que ela antigamente sorria E de flores à cabeça aguardava o acendedor. Penso-lhe a boca inundada por abelhas. Ligando no amor árvores dentro.

GAUCHE O VERSO FAÇO

De afogar-me os medos Do fluir das mãos De passear a alma Pelo céu no chão De garfar o tempo De roer o espaço De morder clemente De andar de lado Já premeditando O mover futuro O verso tortinho Faço no teu muro E sigo o caminho Muito embora impura A margem

ARROTANDO PEIXES-DIAMANTE

Sem a voz de fora. Quando os seres falam por dentro O rio flui mais limpo, Arrotando peixes/diamante E pondo no eixo seres em curvatura. Ontem, o ser, presa de um castelo, Se cegava no por-fora. Por dentro, dá pra ouvir a voz dela. E de seus saltos nas sebes, E de seus cálices colorindo, Fluindo, em silêncio. Vejo um barco de inteirezas No rio carinhoso de dentro. Não sabe pra onde vai. Onde está. Não sabe se é. Só flui. Molha o interior no bafo do poema...

O REBELDE

E assim que passou o sétimo dia, Ele descansou em sua rede trançada de raios Permanecendo assim por séculos antes de voltar a criar. Luci Ferrigno t omava uma branquinha,  enquanto folheava em ventania, com inveja de seu pai se balançando. Comia um céu estrelado E lendo essa história, Pensava: "será que foi assim? Não foram tantos séculos." Fechou o livro- nebulosa. Ligou uma galáxia e ficou vendo com sua turma de anjos supurados programas proibidos no buraco negro. Depois de esfregar os olhos De sono, despencou. Com a turma toda. Um pedaço de meteoro atingiu os olhos Da Terra. Pensaram monges que fora de propósito. Desmemoriados pela queda, os anjos deram aos roqueiros o tema da rebelião. A galáxia ficou eternamente ligada. Deus só sorriu da queda desastrada, muito embora a Terra chorasse de olho redondamente vermelho.

EU TE PEÇO

Eu te peço perdão pela explosão do meu peito Pela covardia de não te falar antes dele explodir Eu te peço perdão por dar asas ao ego Eu te peço perdão por criar-te diversa Por não lamber teu coração de mel e bondade Eu te peço perdão por ser um cartaz no poste Com tuas faces apagadas 

O TREM

O trem. A mulher inominável. Só você a vê. O olhar penetra fundo nos trilhos . O bruto corte, a inesperada carona. Meus ninhos morrem. Embranquecem. Os céus, plenos, sorriem. Aquecem. A viagem prossegue. O trem respira e passa o lenço no rosto.

MARIPOSINHA INFIEL

Mariposinha danada! Não consegue ser fiel, Olha uma luz, já se agrada, Vê estrela, jura ao céu. Ontem: aquela luzinha Da casinha do Israel; Anteontem: um brilhinho Nos brinquinhos de Isabel. Mariposinha inconstante, Excitadinha por luz, Por causa de estrela nova Abandona a que a conduz. Outro dia, em minha casa, Deitava eu no sofá, Ela a uma acesa lanterna Começou a rodear. Olhou um toco de vela Que acendi, foi xavecar. "É que são tantas as belas! Como a só uma cercar?" Minha doce namorada, Da visão fecha as janelas! Se eu pegar essa avoada Nos teus olhos, mato ela!

QUANDO VOCÊ CASOU

Você olh ou para a frente, Você o lhou para os lados, Limpou as margens do s olhos, Você se sentou. Quando você viu a peça, Quando você escutou a peça, Você pensou, Limpou as margens, Virou do avesso. Hoje você não consegue julgar. A peça foi boa? Não viu ... Quando você virou do avesso,   Quando você ouviu a música da peça, Foi como se ouro entrasse pelas orelhas, Esqueceu o enredo e fechou os olhos. Sentiu o cheiro de seus cabelos E a cor d o som que ela emitia, Descobrindo uma razão pra casar E seguir a dona dos cabelos Para sempre .

ESTAR DENTRO DA PAREDE

Estar dentro da parede há séculos. Ouvidos se estragando após ranhuras constantes. Crianças raspando as essências da cal. Pancadas distorcendo estômagos de argamassa. Há traços de sangue nas omoplatas. Estar dentro é tecer uma dimensão fechada. Uma dimensão que imagina o fora como sonho. A dimensão do fora gera filosofias e religiões. Dentro das paredes uma verdade única. Há traços de cimento nas suas omoplatas. Há uma dureza que vem da massa densa. De fundamentos sólidos geraram-se limites. Há outras durezas de tijolos e blocos. Mas sempre de pensar na dimensão do fora Criam-se lendas D'Os-que-usam-Colheres-para-o-chapisco.

RECHEIO INSEGURO

...Quando canso, sento, Lembro o que passou, Na escrita mexo O feijão da dor. E recrio os ossos Com arroz pensado. E transformo gozos No ser temperados. Quando os pratos boto, Pego, os lambo e os trinco. E se aos seios mostras, Em seus bicos brinco. Quando o suco espalho Do ser em vermelho, Quase esqueço alhos, Fritos desesperos. Única, olha, há vermes Sobre a mesa em pelo. Toca, irmã de Aquiles! Lava os cotovelos! Há uns pontos fracos Neste amor-de-mesa: Recheio inseguro, Tempo de alma presa.

JA ESTOU NO CINQUENTUM

Está certo. Sempre falo O texto de minha aldeia. Também sei que isto exala À pessoana cadeia. Sei que me uso do avesso, Indo do fim pro começo. Entre restos de um ser móvel, Sou do pó e pago o preço. Sou triste? Pra uns o sou. Alegre? Outros supõem. Se enxergam d'alma a derme, É o poema que me expõe. Me arrumem vaias breves. Meu texto segue, incolor. Por mim, daqui eu ir i a Sair, mas o Diretor... Já estou nos cinquentum. E vou vivendo pra lá, Bem longe, a voz sem um Som que agrade ao escutar.

MINHA MÁQUINA

Das 8 as 12,  Das 12 as 16,  Das 16 as 20,  Das 20 as 24,  Das 24 as 8, durmo. Assim, usam minha M ENQUANTO ISSO Que já não me reconhece É FATO. Trava quando me vê ENTE. Na mesa, me vira o rosto. Na sala, não quer saber. PORÉM tão PEN.

COMECEI COM HQ

Para as pessoas: palavras-poros-buracos-abismos-querer não-dizer. Travei batalhas no chão um pouco antes de me abrir pras palavras densas. Não te rias, minha sopa bela de letras, mas comecei desenhando F de Fantasma. Mas depois de F veio SH de Super-Homem. K de Kent. B de Bat. Desenhei letras em barros, muros, berros: monturos meus. Como disse: está e não está aqui. Além. Desde antes de. Olha meu ser/ventre por letras/olhos de Capeto/Kripton .Viu? Por isso muitos veículos/words meus salvam e atropelam pessoas.

VAI E VEM NA AVENIDA NOVE

O uv imos a voz alquímica  dos sons em seus quadris , a barcando-nos com seus tons atávicos . E quando você é apenas uma pasta no solo Ela vem , dança ao som dos tambores e lh e diz : - Desculpe, eu não lhe vi.  E do mesmo modo que veio V ai, a avançar na avenida nove. Dali a pouco chega Lilith , A faxineira da Terracom Q ue você nunca viu, S orri a se agach ar sem pressa, A desobstruir o bueiro D as folhas pisadas de seu c oração, Deitado há pouco na avenida nove .

O CASULO

Herdou de seus antepassados  a glória de uma mente indagadora. Herdou também uma biblioteca  para afugentar limos do cérebro. Não teve fome para escrever seu destino, acionou a vida, bebendo e assaltando imagens. Herdou de seus antepassados estalos inspirados. O sol posou para o seu poema de auroras, instalando um grande traço apolíneo . Sempre com sede de inutensílios, traficou no espaço em branco do papel. A herança compondo o que é e será do que foi. A herança letreando sua carcaça larga. Mas o pleno est ava ali, no seu vazio.

SUJEITOS DE MESMA MORTALIDADE

Uma hamster numa gaiola rodando rodando rodando até passar a noite, e quando esta acabar acordarei num átimo e ela dormirá. Condenados a não contar os passos um do outro, o destino nos impulsionará, cada qual em seu momento, até aquele instante de queda,  que nos iguala no Himalaia do Efêmero, quando o cérebro desinstala e se entrega ao mistério, quem sabe.

HOMEM SOLITÁRIO

O homem solitário acompanhado  de uma excelente família fechado em si mesmo não consegue achar a chave para o tempo inicial quando havia um sol um mar uma lua diferentes e uma guitarra com muitas canções de amor. O homem solitário acompanhado de uma excelente família no retrato.

PRA FICAR FELIZ

Um poeta me disse que pra ficar contente basta sentar no bar pedir chopp ou cerveja comer um escondinho ou fritas basta. Pra ficar alegre uma boa conversa de preferência breve sobre a vida basta. Pra ficar de boa olhar o horizonte andar à toa rimar hoje com ontem basta. Mas pra ficar feliz é tudo isso junto mais o encontro de uma Mulher que seja o complemento da Vida que se quer.

QUEM SOMOS

Que Deus esteja, amigas sombras! Somos necessidade?  Que será  de nós?   Sem a luz, sumimos. Conheço-vos desde a primeira. Éramos sombras do vulto de Deus. Como éramos gigantes! Fazíamos covas pra que anjos sem asas brincassem dentro. Assim, só pra ter o prazer de puxá-los sujos. Sentir deles o gesto com açúcar dava uma paz.

DEPOIS DA QUEDA

Aquela mulher, flor de alguma coisa, descobriu que seu homem está na raiz. Não sobe ele ao caule, aos galhos, às folhas, às flores. Mas está pronta a perdoá-lo. Está caindo da árvore, ao sabor do vento que a lançou agora, de encontro à raiz. Quem sabe agora eles se entendam. Depois da queda, a união feliz.

ENQUANTO ENQUANTO

Enquanto Deus e o Diabo jogam as bolas que são o sol e a lua não dão cabo da dúvida dos homens sobre esse jogo e a hora que ele acaba. Do meu bolso cai um papel de alma fina que pretendia usar riscando um poema quando a dor apertasse perto de onde havia um coração , enquanto os dois sorriem e acertam a bola do sol nos meus olhos, que estilhaçam, e xingo de filhos da lua a ambos, que chutaram a bola, enquanto apanho o papel do chão da retina, ainda bom pra um poema.